Por Alexandre Facciolla

Quando um mesmo fato fere direitos individuais de diversos consumidores, há interesse social que legitima o Ministério Público a entrar com uma Ação Civil Pública. Esse foi o entendimento da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao negar Recurso Especial da empresa Mapfre Seguros e manter ação do MP de Goiás que pede indenização coletiva de R$ 5 milhões e multa diária de R$ 30 mil devido à venda, pela seguradora, de automóveis sinistrados, com perda total, como seminovos.

Na ação, o MP goiano exige que a Mapfre informe o estado dos carros ao Departamento Estadual de Trânsito de Goiás. Segundo o processo, a seguradora não comunica a perda total dos carros ao órgão e a informação não consta no documento único de transferência (DUT). Os consumidores, por sua vez, além de pagarem 30% a mais do valor de um carro com perda total reformado, só ficam sabendo do sinistro quando tentam fazer o seguro e a empresa nega, pois o carro já fora objeto de indenização total. A ação também pede que o Detran pague R$ 10 mil a cada carro não informado.

A Mapfre alegou no RE que não é fornecedora de veículos e, portanto, não haveria relação de consumo. Segundo a empresa, o caso concreto envolve direitos individuais que interessam somente a seus titulares, o que tiraria do MP a função de representá-los, já que não seria o caso de defesa de direito difuso.

O ministro Humberto Martins, relator do caso, rebateu a argumentação da seguradora baseando-se no artigo 3° do Código de Defesa do Consumidor, o qual traz, segundo a decisão, uma definição ampla de “fornecedor”, bastando a presença do consumidor para que a relação seja de consumo.

Segundo Martins, a Mapfre Seguros “enquadra-se, portanto, na definição de ‘fornecedor’ com legitimação passiva ‘ad causam’ para ser demandada em Ação Civil Pública”. Além disso, a ação coletiva pelo MP teria o condão de substituir as várias ações individuais por uma só ação coletiva, com vistas a obter um provimento único, célere e livre de decisões conflitantes.

A determinação do STJ também teve como fundamento o artigo 81, parágrafo único, inciso III; e o artigo 82, inciso I, do CDC. A partir deles, o voto do ministro relator afirma que há autorização para a “tutela coletiva dos interesses ou direitos individuais homogêneos, assim considerados por guardarem entre si origem comum”. De acordo com o voto, “a multiplicidade de eventos lesivos comuns atribuídos à seguradora possui, sem dúvida, repercussão social” o que torna “indiscutíveis o interesse de agir e a legitimidade do Ministério Público para promover a referida ação”, conclui. A decisão segue recente decisão do STF.