“Haverá cooperação com o Planalto, mas não vassalagem”, diz Greenhalgh A seguir, os principais trechos da entrevista do deputado Luiz Eduardo Greenhalgh ao Valor.

Valor: O que sr. pretende fazer em relação à tramitação das MPs?

Luiz Eduardo Greenhalgh: Há uma comissão mista, presidida pelo senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e relatada pelo deputado Sigmaringa Seixas (PT-DF), tratando do assunto. Se o resultado for satisfatório, vamos aplicar imediatamente. As MPs tratam de temas que, em geral, são tratados por projetos de lei parcial ou totalmente de iniciativa dos deputados. Uma das idéias é, quando a MP for remetida, apensá-la aos projetos que tratam do mesmo tema, de tal sorte a dar a chance ao relator de, num projeto de conversão, aproveitar as idéias e sugestões feitas pelos deputados. Uma terceira questão é ser mais rigoroso na análise dos princípios de urgência e relevância. Quem é que diz se uma medida é urgente ou relevante? É o governo, mas a Câmara e o Congresso não podem ficar passivos. Compreendo que o governo usa muito o expediente da MP porque governa numa velocidade maior que a do parlamento, mas não posso tolerar que a pauta do Congresso seja 85% de MPs.

Valor: Quais serão as prioridades do Legislativo neste e no próximo ano?

Greenhalgh: Tenho um desafio nos próximos 30 dias, que é a negociação da MP 232 (que aumentou impostos). Do jeito que está, dificilmente será aprovada. A sociedade está mobilizada contra ela. O governo tem que ouvir os clamores da sociedade e as opiniões do parlamento. Essa MP é extremamente problemática. Prejudica o agronegócio, as cooperativas, os profissionais liberais. Fora disso, há a Lei de Biossegurança, a PEC do trabalho escravo, a PEC paralela da reforma da previdência e as reformas tributária, política e sindical.

Valor: A autonomia do Banco Central é um tema maduro no Congresso?

Greenhalgh: Antes de estar maduro entre meus colegas, tem que estar maduro no governo. Há muita divergência sobre isso.

Valor: Qual é a sua opinião?

Greenhalgh: Na primeira vez em que esse assunto foi colocado, manifestei restrições. Considero que o BC tem hoje de fato independência e não necessitaria legalizar. Mas, já ouvi também o argumento de que, se reconheço que a independência existe de fato, por que não legalizá-la? Vai haver um debate grande, mas não é algo para os próximos seis meses. Duas coisas me impressionaram numa conversa que tive com o ministro (Antonio) Palocci. A primeira é que o (Nelson) Mandela e um governo mais à esquerda do Chile deram independência a seus respectivos bancos centrais. A segunda é que, em todos os países que fizeram isso, os juros caíram de dois a três pontos percentuais. Os juros (a taxa Selic) estão retomando o crescimento. Começamos com 26%, viemos para 16% e hoje estamos com 18,25%. Seria bom fazer um esforço para a queda dos juros.

Valor: Como deve ser a relação do Legislativo com o governo?

Greenhalgh: De cooperação recíproca e respeito mútuo. Não serei o presidente que vai criar crise com o Judiciário nem com o Executivo, mas também quero que esses dois poderes respeitem o parlamento. Haverá cooperação e respeito, mas mão haverá vassalagem.

Valor: O sr. pretende tratar da abertura dos arquivos da ditadura?

Greenhalgh: Muita gente, porque fui escolhido pelo governo e porque a base aliada está me apoiando, me chama de candidato oficial e diz que isso retiraria de mim a possibilidade de independência. Digo e reafirmo que não. É verdade que sou petista e lutei 25 anos da minha vida para que Lula fosse eleito presidente. Ele é meu amigo, fui seu advogado. Há momentos em que, amizade amizade, opiniões à parte. Foi o caso dos arquivos. Um certo desalento tomou conta de mim quando, em maio de 2003, ganhamos ação na Justiça, o governo tinha tudo para começar o processo de abertura. Até porque, por causa da decisão da Justiça, não precisava explicar aos militares. A decisão não era dele. Era só cumprir uma decisão judicial. É evidente que não posso transformar a presidência da Câmara em palco de militância sobre esse assunto, mas na presidência vou fazer com que as coisas, na Câmara, possam andar no sentido desse encontro da vontade legislativa com a vontade da sociedade.

Valor: Como será a relação com o Senado?

Greenhalgh: A relação dos presidentes João Paulo e Sarney foi muito boa, mas de qualquer forma a Câmara, em vários momentos, votou a parte amarga de projetos e o Senado ficou com a fatia boa. Um exemplo foi a PEC paralela da Previdência. Quero ter uma boa relação com o senador Renan Calheiros, mas quero combinar que o papel do Senado é o de Casa revisora, porque representa os Estados, e o da Câmara é o de legislar, porque representa o povo brasileiro.

Valor: Como fica a independência dos poderes se o governo se jogou de maneira tão pesada na disputa da Câmara?

Greenhalgh: A culpa não é minha. É de uma pessoa chamada Garotinho. A aproximação de um dos candidatos com ele, que hoje é um adversário e impede que a relação do governo com o Estado do Rio flua, para tirar dividendos para a sua próxima campanha presidencial, exasperou quem estava meio discreto. As pessoas (os ministros do PT) começaram a se movimentar mais. De qualquer forma, a independência não está arranhada.