Tribunal carioca é investigado O presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro, desembargador Marcus Faver, que integra a comissão criada para apurar supostas fraudes no sistema de distribuição de processos no Tribunal de Justiça, disse ontem que será investigada a possibilidade de envolvimento de desembargadores no esquema. Ele também anunciou que, tão logo o trabalho da comissão seja concluído, deverá ser aberto um processo criminal para punir os culpados.

— Já ficou constatada a irregularidade no sistema de distribuição. É inequívoca e tem três segmentos: os advogados que provocavam, os funcionários que propiciavam e os desembargadores que trabalhavam no caso. Vamos tentar desvendar este nó — disse Marcus Faver.

A comissão foi criada na segunda-feira pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça, depois que uma investigação preliminar constatou irregularidades na distribuição de 12 processos, alguns deles envolvendo valores elevados. A denúncia que motivou a investigação foi feita pelo advogado José Antônio Fichtner. Os funcionários do setor de distribuição foram afastados preventivamente.

Fraudes seriam “ponta de iceberg”

A suposta fraude na distribuição valia-se de um dispositivo do regimento interno que obriga o desembargador em férias ou licença de saúde a devolver os processos ainda não julgados. Ao retornar ao tribunal, estes processos não são redistribuídos por sorteio, mas encaminhados para os desembargadores que estão voltando de férias ou de licença ou com um menor número de processos para julgar. A investigação mostrou que, nos 12 casos, os processos foram dirigidos a desembargadores, a título de redistribuição, sem que estes estivessem retornando de férias ou licença de saúde. O correto seria o sorteio eletrônico.

Em entrevista ontem à rádio CBN, o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Miguel Pachá, disse que a constatação de fraudes em 12 processos pode ser “a ponta de um iceberg”.

— Vamos apurar. O Tribunal tem interesse de provar que somos transparentes, pessoas sérias e honestas e, se alguém utilizou-se de método escuso para cometer irregularidade, cometeu crime previsto na lei penal, que é a manipulação do sistema de computação — disse Pachá.

“O problema é o elemento humano”

Além de Marcus Faver, a comissão é integrada pelos desembargadores Humberto Manes e Antônio Siqueira. Faver disse que, até o momento, não há evidência do envolvimento de desembargadores, mas todas as hipóteses serão exploradas. Segundo ele, é possível que a manipulação tenha sido feita sem o conhecimento de magistrados:

— Um funcionário pode conhecer a tendência de determinado desembargador ao apreciar uma causa e dirigir um processo de seu interesse para este magistrado. Sem a ajuda de um funcionário, seria impossível praticar a fraude.

O trabalho da comissão, que Faver promete ser rápido, deverá provocar um processo administrativo e outro processo criminal. O Tribunal também estuda um destino para os 12 processos que sofreram distribuição irregular:

— Vamos verificar um a um, os que estão em andamento e os que já foram julgados.

Um dos processos, que tem como origem a 2 Vara Empresarial, envolve um pedido de indenização movido por empresas do Grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, contra fundos de pensão ligados ao processo de leilão das telefônicas. O advogado José Antônio Fichtner contestou o valor atribuído pelo Opportunity à causa e requereu a sua equiparação ao valor da indenização.

O juiz titular da 2 Vara Empresarial, Luís Felipe Salomão, negou o pedido de Fichtner, mas quem primeiro recorreu da decisão foi justamente a parte favorecida, o Opportunity. O recurso foi encaminhado ao desembargador Edson Queiróz Scisínio Dias, da 14 Câmara Cível, com o código de redistribuição.

Marcus Faver disse que o sistema de distribuição do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro é perfeito, razão pela qual é referência de outros tribunais brasileiros.

— O problema é o elemento humano — lamentou.

Miguel Pachá confirmou o afastamento de todos os funcionários do setor de distribuição. Explicou que apenas alguns dos casos investigados, e não todos, como O GLOBO noticiou ontem, envolvem quantias elevadas. Há processos de pensão alimentícia e separações judiciais.