Padre Zé é acusado de desviar R$ 2,6 mi Os promotores de Justiça Alexandre de Oliveira Alcântara, Alexandre Pinto Moreira e Carlos Augusto Tomás Vasconcelos, da Comarca de Sobral, ingressaram com Ação de Improbidade Administrativa, na 2ª Vara da Comarca de Sobral, contra o ex-provedor da Santa Casa de Misericórdia do Município, padre José Linhares, a ex-contadora da Instituição, Maria Cavalcante Linhares, e o ex-coordenador de despesa, José Ozanir de Andrade Aragão.

A ação atinge ainda o empresário Márcio de Vasconcelos Rocha e a ex-administradora do Hotel Visconde, Valéria Frota Aragão. Segundo os promotores, relatório contábil produzido após auditoria de mais de três meses nas contas da Santa Casa constatou desvio de aproximadamente R$ 2,6 milhões. Noventa por cento dos recursos do hospital advêm do Sistema Único de Saúde (SUS).

A polêmica em torno da gestão da Santa Casa de Sobral começou no final de 2003, quando o então bispo de Sobral, dom Aldo de Cillo Pagotto, afastou o padre José Linhares do cargo de provedor do hospital e nomeou como substituto o padre Emídio Moura Gomes.

A nova administração contratou auditoria que constatou diversas irregularidades entre o período de 1998 a 2002. Conforme o relatório da auditoria, foram verificados vários registros contábeis relativos a adiantamentos concedidos em favor da empresa ‘‘Execute’’ (que tem Márcio de Vasconcelos Rocha com sócio-proprietário) para fins de aquisição de computadores.

Os documentos incluídos nos processos contábeis foram considerados inábeis para fins fiscais e contemplavam a compra de 10 impressoras, no valor total de R$ 4 mil, embora o adiantamento tivesse sido de R$ 67,1 mil em cheque ao portador.

Os auditores verificaram, ainda, pagamentos de bens e serviços estranhos à atividade da Santa Casa, a cobertura de despesas pessoais de terceiros, inclusive do então provedor do hospital.

RESPOSTA – Em resposta às denúncias, o empresário Márcio de Vasconcelos Rocha informou que à época que era apenas representante da RCL, empresa com sede em Fortaleza, que vendeu vários equipamentos de informática à Santa Casa, no valor total de R$ 67.159,00 e não apenas 10 impressoras.

Segundo o empresário, foram feitos três adiantamentos nos valores de R$ 20 mil, R$ 40 mil e R$ 7.159,00 e todo o material foi entregue. ‘‘O que houve foi um erro de lançamento contábil, por parte da Santa Casa. Tenho cópia da nota fiscal, nº 152, de 21/09/1998 e do pedido’’, explicou Márcio.

O empresário esclareceu que a Execute é o nome ‘fantasia’ da sua empresa e confirma que a venda dos equipamentos foi lícita. Informou, ainda, que o diretor financeiro da entidade, José Valmir de Andrade, conferiu toda a documentação da compra.

Promotores pedem seqüestro de bens

A ação de improbidade administrativa proposta pelos promotores Alexandre Alcântara, Alexandre Pinto e Carlos Augusto contra o padre José Linhares e outros quatro suspeitos de envolvimento em desvios de recursos da Santa Casa daquele município requer ao juiz da 2ª Vara, juiz Pedro Percy, além da quebra do sigilo bancário dos acionados, o seqüestro de seus bens e a decretação da indisponibilidade de seu patrimônio até o limite necessário para garantir o ressarcimento do dano ao patrimônio público.

Os integrantes do Ministério Público pedem, ainda, o ressarcimento integral (com juros e correções) dos danos causados ao hospital, a perda de funções públicas que exerçam os denunciados, a suspensão dos direitos políticos entre cinco e oito anos, e o impedimento de virem a exercer qualquer cargo administrativo ou de ordenamento de despesa na Santa Casa ou em outra instituição que receba recursos públicos até o final do processo.

Para os promotores de Justiça, está demonstrado o desvio de recursos públicos para satisfazer interesses totalmente particulares.‘‘O relatório contábil fala por si só’’, destacam. Eles suspeitam que despesas realizadas em ano eleitoral, como compra de tecidos e aparelhos de CD, teriam sido relativas à campanha.

A auditoria constatou que enquanto a ex-administradora do Hotel Visconde recebia gratificações da Santa Casa, convidados do padre José Linhares como músicos de sua campanha, integrantes do comitê e outros profissionais, tinham isenção total de diárias no hotel.

Segundo os promotores, Maria Cavalcante Linhares seria a contadora que manipulava os dados para que o grupo lograsse êxito com a apropriação de verbas públicas. Eles observam que o dinheiro desviado resultou no endividamento e sucateamento do hospital, falta de leitos, inclusive UTI neonatal e impossibilidade de atendimento.

Advogado diz que há complô

A reportagem tentou durante toda a tarde de ontem contato com o padre José Linhares. Segundo o ex-assessor e ex-coordenador de despesa da Santa Casa, José Ozanir de Andrade Aragão, Linhares celebrou missa em Sobral, às 9 horas, e à tarde seguiu para Fortaleza, de onde viajaria para Brasília.

Segundo o advogado do padre, Francisco Lopes, o Ministério Público está cumprindo seu dever, mas para ele as acusações não passam de complô. “Se o padre usava dinheiro da Santa Casa era para ressarcir despesas pessoais porque não tinha salário”, justificou. Em relação a todos os envolvidos na ação, o advogado diz que “estão enlameando o nome de pessoas de respeito”.

De acordo com Lopes, a firma de José Ozanir é reconhecida e apenas fornecia nota fiscal e prestava assessoria administrativa para a Santa Casa. Já Maria Cavalcante Linhares, conforme o advogado, fazia pagamentos autorizados por dom Aldo Pagotto, inclusive para o padre José Linhares. “O hotel pertence à Irmandade e sempre deu lucro, mas não recebia dotações públicas”, alegou.

LEI — Na ação de improbidade proposta pelo Ministério Público estadual, os promotores de Justiça Alexandre Alcântara, Alexandre Pinto e Carlos Augusto questionam a constitucionalidade da Lei Federal 10.628, de 24 de dezembro de 2002.

A lei estendeu aos agentes públicos (prefeitos, deputados, secretários estaduais, governadores) foro privilegiado em ações civis. Com base neste dispositivo, o deputado federal José Linhares não poderia ser denunciado perante a Comarca de Sobral. A decisão caberá ao juiz Pedro Percy.

AUDITORIA – Entre as irregularidades apontadas pela auditoria estariam pagamentos indevidos ou em desacordo com os interesses da entidade; manipulação de informações contábeis e financeiras; lançamentos sem documentação de suporte e pagamento de prestação de serviço à funcionária da Santa Casa.