Os benefícios da reforma da Justiça As recentes alterações contempladas pela reforma do Judiciário trarão pouquíssimos benefícios para a Justiça. As atuais dificuldades continuarão sem solução, apressando-se aqueles segundo os quais julgavam a reforma solução de grande parte dos problemas da Justiça brasileira. Nas palavras do Presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Edson Vidigal, a reforma é “um esparadrapo numa ferida”. O sentimento é de frustração. Depois de 13 anos de tramitação no Congresso Nacional, o governo federal aprovou, no Senado, a reforma do Judiciário. Entre os pontos mais importantes estão a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) -formados por membros do Judiciário, do Ministério Público (MP) e de entidades civis que ficarão encarregados do controle externo do Judiciário e do MP. Eles serão instalados em 180 dias da promulgação da emenda constitucional, e serão responsáveis pelo acompanhamento da execução orçamentária de cada Tribunal, bem como pela fiscalização do trabalho de Magistrados e membros do MP.

Apesar de constituir instrumento que, aparentemente, dará maior transparência à máquina judiciária, a crítica está na inafastável reprodução do corporativismo dos encarregados da função jurisdicional do Estado. A punição de Magistrados e de membros do MP, comprovadamente envolvidos em corrupção, ainda dependerá de decisão judicial, haja vista que os conselhos não terão poderes para promover a condenação dos respectivos responsáveis. Além disso, são formados, ainda que parcialmente, por membros pertencentes aos órgãos fiscalizados. Em segundo lugar vem a súmula vinculante, mecanismo que obriga os juízes e os Tribunais de instâncias inferiores a seguirem as orientações do Supremo Tribunal Federal (STF) aprovadas por, pelo menos, oito de seus 11 ministros.

A súmula vinculante limita demasiadamente a liberdade de julgamento dos Juízes, impedindo-os de contrariar as súmulas ainda que sob argumentos novos, originais e diversos, sem interferir no tempo do processo. O dispositivo tem a ver com direção do julgamento das questões sumuladas, não com a celeridade com que essas decisões sejam tomadas. A reforma ainda ampliou os poderes das defensorias públicas, estabeleceu a quarentena para magistrados e instituiu a federalização de crimes contra direitos humanos.

O principal efeito produzido pela reforma do Judiciário foi apenas e tão-somente diminuir a infinidade de processos que hoje está em curso nos Tribunais. Porém, não é por meio da diminuição do número de feitos que se atingirá um Judiciário mais eficaz, mas sim por meio do melhor aparelhamento do Judiciário para lidar com as demandas que nascem naturalmente da vida social. As alterações recentemente contempladas são muito pouco para satisfazer aos anseios e os interesses da população brasileira em relação à máquina judiciária.

As duas maiores questões -o acesso da sociedade à Justiça e sua morosidade- não foram enfrentadas pelo conjunto de normas contemplado pela reforma do Judiciário. O quadro que retrata o acesso dos cidadãos à Justiça é desolador. Cada vez mais as portas da Justiça estão fechadas ao cidadão comum. As dificuldades surgem já a partir do nascimento da necessidade de guarida do Poder Judiciário, materializada na cobrança de custas e taxas judiciárias exageradas.

No que diz respeito à morosidade da Justiça, a reforma não lidou com o tempo do processo. Reduzir o tempo de tramitação do processo deveria ter sido tratado com absoluta prioridade pelo governo federal. Todavia, não causou estranheza a despreocupação com essa questão, já que ele é réu em aproximadamente setenta por cento dos processos atualmente em curso no Judiciário brasileiro. Segundo um levantamento feito pela Comissão de Assuntos Institucionais da OAB-SP, qualquer processo na região, entre primeira e segunda instâncias, leva em média 7 anos, e pode chegar a mais de 10 anos, para ser julgado. Só a distribuição dos recursos em segunda instância demora por volta de cinco anos.

Assim, continuaremos a conviver com a alegação de falta de verba e de estrutura, com a edição de leis irracionais com número infinito de recursos, com a informatização precária, e com a alegação de falta de preenchimento de vagas. Segundo a OAB/SP, na região havia onze mil cargos vagos para Juízes, Oficiais de Justiça, escreventes e auxiliares da Justiça.

Dessa forma, o governo federal deve enfrentar os problemas do Judiciário, promovendo ampla e efetiva reforma, na preservação dos interesses dos cidadãos. Não podemos deixar de reconhecer que ocorreram pequenas alterações, mas que representam muito pouco em relação às profundas feridas da Justiça brasileira.

O governo federal deve empenhar-se para alterar a imagem desastrosa do Judiciário, que deve trazer segurança jurídica, e é ferramenta indispensável da convivência harmoniosa dos integrantes de uma sociedade e pilar sobre o qual se sustenta a democracia. A alteração almejada do Judiciário aproximará a Justiça da sociedade e das necessidades mais básicas. Será o exercício pleno da cidadania no País.

(Gazeta Mercantil/Legal & Jurisprudência – Pág. 1)(Paulo Ciari – Advogado, sócio do escritório Remor Ribas Fagundes Amad e Ciari Advogados. Formado pela PUC, com mestrado em Processo Civil. )