Ministro nega corrupção em sua gestão O ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) negou não apenas que recebesse dinheiro da empresa Leão Leão e o repassasse ao PT, mas também a possibilidade de ter havido corrupção sistemática na Prefeitura de Ribeirão Preto sem o seu conhecimento -afirmação que lhe rendeu o maior embaraço durante a entrevista.

“Eu admito que, numa prefeitura de 10 mil pessoas, assim como aqui [na Fazenda] nós temos 25 mil pessoas, algum procedimento pode ser feito sem o conhecimento da coordenação, da chefia. Agora, aí não se trata de um procedimento eventual; a acusação é que houve um procedimento permanente, durante dois anos. Aí eu lhe digo: isso não ocorreu. Porque não ocorreria sem o meu conhecimento”, afirmou Palocci. A declaração do ministro levou à questão natural: o raciocínio põe em xeque a versão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que nada sabia a respeito dos pagamentos feitos pelo PT a deputados da base aliada.

Confrontado com a contradição, Palocci produziu a resposta mais evasiva da entrevista: “Vou dar uma resposta mais de coração do que de razão. Tenho convivência de muita intimidade com o presidente Lula. O presidente Lula não tinha informações sobre essas coisas, não conhecia esses procedimentos que foram relatados, não conhecia muitas pessoas que foram citadas”, disse.

Palocci foi acusado pelo advogado Rogério Tadeu Buratti, que foi seu secretário de Governo na sua primeira gestão na prefeitura de Ribeirão Preto (1993-1996), de receber R$ 50 mil por mês da empresa de 2001 a 2002 e repassar a Delúbio Soares, então tesoureiro do PT. A Leão Leão ganhou a licitação para recolher lixo em Ribeirão Preto. A empresa tem um contrato de aproximadamente R$ 50 milhões. O ministro também procurou responder a suspeitas levantadas em relação à proximidade entre Buratti e seus assessores originários da Prefeitura de Ribeirão Preto, em especial seu chefe-de-gabinete, Juscelino Dourado.

Sua linha geral de defesa foi argumentar que as gravações de diálogos com Buratti não demonstram nenhuma influência real do ex-assessor nas decisões do ministério. Palocci se dispôs a abrir seus sigilos telefônico, bancário e fiscal ao Ministério Público. “Em relação aos meus sigilos, não tenho nenhum problema. Não vou distribuí-los Brasil afora, mas se qualquer membro do Ministério Público quiser ter acesso aos meus dados, não precisa nem pedir à Justiça.” Palocci disse que comete erros e não se considera acima de questionamentos, mas voltou a fazer críticas à forma de atuação do Ministério Público de São Paulo, que divulgou na sexta-feira o conteúdo do depoimento de Buratti. “Nós não podemos admitir que pessoas, que agem de maneira indevida, possam colocar autoridades da República sob suspeita dessa maneira”, afirmou. Em meio às negativas, o ministro chegou a se confundir com as palavras. “Sob todos os aspectos, essa mentira é falsa”, afirmou.

CORRUPÇÃO NA PREFEITURA – “Nego em todos os aspectos. Isso não ocorreu, não ocorreria sem o meu conhecimento. Não ocorreram com a minha pessoa, não ocorreram com ordem da minha pessoa, não ocorreram da forma como foram relatados”, afirmou o ministro de Fazenda.

“Quero negar categoricamente essas acusações, negar com a veemência que elas merecem ser negadas, porque são falsas”, disse. Ele ressaltou que a licitação ganha pela empresa Leão Leão não aconteceu na sua gestão. O Ministério Público de São Paulo investiga concorrências públicas em 16 cidades de São Paulo e Minas Gerais no que está sendo chamado de “máfia do lixo”. A “máfia” é investigada em Ribeirão Preto desde 2004. De acordo com a promotoria, que baseou as investigações em escutas telefônicas, as licitações eram fraudadas com a participação de funcionários das prefeituras.

AGENDA – Embora admita que Buratti e Juscelino Dourado sejam amigos, o ministro negou que Buratti estivesse intermediando encontros de empresários com ele. De acordo com Palocci, mesmo nos trechos de gravações divulgados, Buratti sempre se refere à necessidade de marcar encontro com a chefia de gabinete. “A agenda do Ministério da Fazenda e os procedimentos de reuniões do Ministério da Fazenda não estão sujeitos a contatos pessoais”, disse o ministro. “Esse ministério não é uma república de amigos, esse ministério tem instituições extremamente fortes.”

Em gravação feita com autorização da Justiça em julho de 2004, Buratti e Wladimir Poleto (ex-assessor de Palocci) negociam um encontro entre o ministro e o presidente do banco Prósper, Edson Menezes. O encontro ocorreu mas, de acordo com Palocci, três meses depois da gravação. Além disso, a audiência teria sido pedida ao seu chefe-de-gabinete. O ministro afirmou ainda que, de sua atual equipe, conhecia pessoalmente apenas o secretário de Política Econômica, Bernard Appy.

ESCUTA TELEFÔNICA – O ministro considerou absurda a hipótese de seu chefe-de-gabinete ter pedido, por e-mail, o auxílio de Buratti para a compra de um aparelho de escuta telefônica, como divulgado pela revista “Veja”. Ele disse que questionou Dourado sobre o assunto e o chefe-de-gabinete negou. “O único aparelho de escuta que tenho em casa é um estetoscópio”, brincou o ministro.

De acordo com Palocci, seu chefe-de-gabinete enviou um e-mail para a repórter de “Veja” e, em resposta, recebeu outro e-mail, informando que as mensagens eletrônicas enviadas a Buratti não eram dele. Foram pedidas à revista cópias dos e-mails, que não foram enviadas, de acordo com o ministro.

NOVAS DENÚNCIAS – O ministro também disse que não está preocupado com o possível surgimento de novas denúncias. “Não tenho preocupação com o que o que pode vir, porque o que pode vir são coisas que ocorreram. As coisas que ocorreram não me preocupam, me engrandecem”, disse Palocci. “Não temo o porvir e não temo o que está colocado na mesa. Estou absolutamente tranqüilo porque eu sei o que eu fiz e sei o que eu não fiz”, completou.

MINISTÉRIO PÚBLICO – Em sua entrevista, o ministro voltou a criticar a forma de atuação dos procuradores do Ministério Público de São Paulo. “Não é possível que os órgãos de apuração trabalhem com oito meses de gravação soltando notas pela imprensa”, afirmou Palocci. “Não achei correto os procedimentos dos promotores de São Paulo, que se apressaram em divulgar um depoimento que tinha apenas começado, que traduziram palavras do depoente, o depoente que foi colocado em uma situação absolutamente constrangedora”, completou.