Transparência Brasil alerta CPIs sobre Operação Abafa A Transparência Brasil protocolou nesta quinta-feira (25/8) ofício dirigido aos presidentes das CPMIs dos Correios e do Mensalão — respectivamente senadores Delcídio Amaral e Amir Lando — em que alerta para o risco de as investigações em curso perderem o foco da corrupção e “comprarem” as versões convenientes de que tudo não passaria de deslizes eleitorais.

Se permitirem que isso aconteça, segundo a organização, isso equivalerá a aceitar a imputação de que todos os políticos são corruptos. O ofício também foi encaminhado ao presidente da Comissão de Ética da Câmara dos Deputados, Ricardo Izar.

Leia a íntegra do ofício

Exmos. Srs.

Senador Delcidio Amaral, presidente da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito dos Correios

Senador Amir Lando, presidente da Comissão Parlamentar Mista de

Inquérito da Compra de Votos

Deputado Ricardo Izar, presidente da Comissão de Ética da Câmara dos Deputados

São Paulo, 25 de agosto de 2005

Prezados senhores:

Dirijo-me a Vv. Excias. por delegação do Conselho Deliberativo da Transparência Brasil para levar-lhes preocupações desta entidade em relação aos rumos dos trabalhos das Comissões presididas por Vv. Excias. em vista de insistentes e uníssonas alegações partidas de indivíduos suspeitos de irregularidades no âmbito dos escândalos que prendem a atenção do país.

Nossas preocupações manifestam-se em duas vertentes, as quais abordarei na seqüência.

1. A primeira vertente concerne a origem dos recursos que alimentaram o chamado “valerioduto”. Como é óbvio, tais recursos se originaram de algum lugar. Embora não se possa descartar de plano a hipótese de que talvez tenham sido oferecidos magnanimamente por empresas privadas que prefeririam permanecer no anonimato (hipótese essa que, de todo modo, implicaria delitos de natureza tributária e/ou crimes financeiros), tal conjectura é por todos os títulos implausível. É muito mais provável que esses recursos tivessem correspondido a subornos pagos pela obtenção de vantagens conseguidas em transações ilícitas com o Estado. Em nosso entender, levantar os alimentadores de propinodutos constituiria um dos principais deveres das Comissões presididas por Vv. Excias.

2. A segunda vertente se refere à alegação fácil, externada pela totalidade dos suspeitos, de que os dinheiros que manipularam teriam sido destinados a pagamento de dívidas eleitorais. A valer tal alegação, seria minimamente exigível que os indivíduos acusados apresentassem os nomes e CNPJs das empresas fornecedoras que teriam sido beneficiárias dos pagamentos em questão. No entanto, até agora um único desses beneficiários foi dado à luz (uma certa empresa de marketing eleitoral). É outra vez evidente que, caso esses fornecedores venham a ser identificados, estarão eles sujeitos a penalidades devidas por delitos tributários, fiscais etc.

Nem isso, porém, ocorrerá, caso continue a se aceitar sem discussão a alegação dos suspeitos. E por que, exatamente, se aceita como final essa desculpa conveniente? Por que acreditar em histórias inverificáveis alegadas por acusados de atos criminosos? Afinal, senhores presidentes, um montante qualquer retirado de algum propinoduto e pretensamente usado para pagar fornecedores de campanha na verdade pode ter sido empregado, por exemplo, para adquirir terreno na ilha de Bali, para entesouramento ou para qualquer outro fim que a imaginação contemple. Aceitar-se sem maiores questionamentos a desculpa das dívidas eleitorais equivale a desistir de investigar a corrupção.

No que tange as práticas políticas, equivale também a aceitar que corrupção com finalidade eleitoral seria menos grave do que outras corrupções, com a inevitável conseqüência da extensão, à totalidade dos políticos (pois se afirma que “todo mundo faz”), da pecha de corruptos — o que, decerto, seria inaceitável.

Nunca é demais frisar, senhores presidentes, que os ilícitos de que tratam as Comissões sob a responsabilidade de Vv. Excias. não constituem simples “erros” ou “falhas”, mas crimes.

Acreditamos, senhores presidentes, que de um lado a busca dos fornecedores de dinheiro ilícito e de outro a rejeição do subterfúgio eleitoral apresentado pelos beneficiários devam constituir prioridades absolutas dos trabalhos das três Comissões, e é nesse sentido que instamos Vv. Excias. a agirem.

Agradecendo a atenção, despeço-me,

Atenciosamente,

Claudio Weber Abramo

Diretor executivo