Juízes dão nota baixa à independência do STF Carolina Brígido BRASÍLIA A autonomia das decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) foi colocada em xeque pelos juízes que participaram da pesquisa realizada pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB). Numa escala de zero a dez, o grau de independência das decisões da mais alta Corte do Judiciário ficou com notas médias abaixo de 6 entre os três mil magistrados ouvidos pelo levantamento quando a pergunta referiu-se às relações com o Executivo, o Congresso e os interesses econômicos. O pior resultado foi referente ao relacionamento com o governo: neste quesito, os ministros receberam nota 3,9 quando se tratou da sua independência. A avaliação mais rígida foi feita pelos juízes que estão na carreira há, no máximo, cinco anos. Entre esses, a nota média obtida foi de 3,2. Os magistrados mais antigos, com mais de 21 anos de carreira, foram um pouco mais complacentes com os ministros do STF. A média das notas dadas ficou em 4,5. Entre os ministros do STF, alguns ficaram surpresos com a avaliação e outros, irritados.
O ministro Sepúlveda Pertence limitou-se a negar que haja atrelamento entre as decisões do STF e os interesses políticos defendidos pelo Palácio do Planalto. Mas admitiu que, muitas vezes, o tribunal opta por uma solução em prol do funcionamento das instituições da República. — Não acho que haja atrelamento, no sentido de dependência do Executivo. Mas, historicamente, muitas decisões do STF foram dadas em respeito à responsabilidade e à lógica do funcionamento das instituições — disse Sepúlveda. O ministro Gilmar Mendes discordou da avaliação feita pelos magistrados. Ele questionou a falta de exemplos de casos em que o STF teria decidido para beneficiar indevidamente o poder público.
— Essa pergunta poderia ter vindo acompanhada de exemplos, porque senão faz-se uma análise equivocada. As pessoas podem ter se embaraçado na análise — protestou. Já o ministro Carlos Ayres Britto louvou a iniciativa de se questionar os juízes sobre o assunto. Mas saiu em defesa dos colegas ao alegar que todos agem de forma independente, sem levar em consideração os interesses do Executivo. — Vendo as coisas pelo ângulo de dentro, não acho que as decisões sejam subalternas ao Executivo. Os ministros do STF são independentes. São todos pessoas experimentadas no exercício da profissão, com bom nível de inteligência emocional — disse Ayres Britto.
O presidente do STF, Nelson Jobim, evitou comentar o resultado da pesquisa. O mesmo levantamento concluiu que, para a magistratura brasileira, o STF decide as questões de acordo com os interesses do Congresso Nacional. A nota dada pelos juízes entrevistados para a independência do STF em relação ao Parlamento foi, em média, 5,3. As notas mais baixas também foram dadas por magistrados que ingressaram na carreira nos últimos cinco anos. Entre esse público, a média somou 4,9. Os mais antigos deram nota 5,9 para o mesmo quesito.
Sistema de nomeação causa avaliação negativa Outra conclusão tirada pelo estudo é a de que os ministros do STF têm pouca independência em relação às forças econômicas privadas. A nota média dada ao STF nesse quesito foi de 4,8. Os magistrados mais novos deram nota 4,1 e, os mais antigos, 5,6, em média. O único item em que o STF foi considerado independente foi em relação aos demais tribunais superiores. Nesse quesito, a média foi de 6,5.
Para o presidente da AMB, Rodrigo Collaço, a avaliação negativa da independência do STF decorre principalmente do sistema de nomeação dos ministros. Conforme prevê a Constituição, cabe exclusivamente ao presidente da República escolher o ocupante da vaga. Ao completar 70 anos, o integrante da Corte se aposenta compulsoriamente e abre vaga para a nomeação. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva já nomeou três: Eros Grau, Joaquim Barbosa e Ayres Britto. Em janeiro, quando Carlos Velloso se aposentar, Lula indicará mais um. — A magistratura não concorda com o modo de indicação dos ministros. Quando a pessoa é nomeada pelo presidente da República, pode ficar complicado exigir dela alguma independência. Mas, pessoalmente, acho que não se pode acusar o STF de dependência em relação ao Executivo. Os ministros têm julgado com independência, de forma contrária e favorável ao governo — disse Collaço.