A vitória de Guimarães Numa das mais esperadas votações do ano, o plenário da Assembléia Legislativa rejeitou ontem, por 23 votos contra, 16 a favor, seis votos nulos e um em branco, o pedido de cassação do deputado José Nobre Guimarães (PT). O petista era acusado da prática de caixa 2 na campanha do candidato derrotado ao governo do Estado em 2002, José Airton Cirilo. A votação foi secreta.

Para ter o mandato cassado – o que também iria implicar na suspensão dos seus direitos políticos por até oito anos – eram necessários no mínimo 24 dos 46 votos. O resultado também deixa o deputado do PT ileso de qualquer outra sanção. Na abertura de processo disciplinar, o ouvidor da Casa, deputado Antônio Granja (PSB) havia pedido 30 dias de suspensão do mandato. A proposta foi derrubada durante a tramitação do processo no Conselho de Ética.

Antes mesmo do anúncio oficial do resultado, mas já com a absolvição garantida, Guimarães foi arrastado por apoiadores para fora do plenário. De uma das sacadas da entrada principal da Assembléia, onde chegou carregado por militantes, ele fez um emocionado desabafo para correligionários que vieram de várias municípios do Interior do Estado.

”Essa é a vitória daqueles que acreditavam, como eu acreditei, que não temia julgamento nenhum porque eu estava com a verdade”, disse. Guimarães atribuiu a vitória ao próprio partido e membros de siglas aliadas, como o PMDB, PSB, PL, PSL e PCdoB e evitou críticas ao PSDB, autor do pedido de cassação. Entre os vários telefonemas de felicitação que recebeu, ainda entre os correligionários, uma chamou a atenção: do irmão e ex-presidente nacional do PT, José Genoino.

Os convidados praticamente lotaram as galerias do plenário e a entrada principal da Assembléia. Além de militantes, a votação atraiu vários vereadores aliados da prefeita Luizianne Lins (PT) na Câmara Municipal de Fortaleza, entre eles o presidente, Tin Gomes (PHS), secretários e membros do partido.

Também compareceram o superintendente do Departamento Nacional de Obras Contas as Secas (Dnocs), Eudoro Santana, e o presidente do Banco do Nordeste (BNB), Roberto Smith. José Airton, de quem Guimarães foi coordenador de campanha, cujo episódio acabou levando o deputado a mais de cinco meses de exposição negativa na opinião pública, não compareceu.

Na prática, o resultado final da votação mostrou um placar de 16 votos pela cassação e 30 contra, já que apenas os votos ”sim” eram contabilizados contra o deputado, enquanto os votos brancos e nulos beneficiavam o petista.

O resultado isolou o PSDB. Autor do pedido de cassação, a bancada tucana sequer repetiu no placar o número de deputados na Casa, 17. Conforme O POVO mostrou ontem, o alto comando tucano no Estado esperava entre 25 e 27 votos pela cassação. Antes da votação, no entanto, deputados do partido já refaziam as contas, admitindo, a interlocutores, a absolvição de Guimarães.

Na semana passada, o líder da sigla na Casa, deputado João Jaime, anunciou o fechamento de questão pela cassação. Ontem, da tribuna, de onde manteve a defesa da perda do mandato, João Jaime resumiu-se a relatar os principais pontos do processo disciplinar instaurado no Conselho de Ética da Casa.

O tucano disse que, com base na origem ignorada de R$ 250 mil recebidos por Guimarães – segundo o petista para pagar contas atrasadas da campanha de José Airton – não tinha outra ”saída justa”, a não ser pedir a cassação.


BASTIDORES

* Antes de começarem as discussões em torno de sua cassação, o deputado Guimarães fez o sinal da cruz. Ele foi saudar a militância, que acompanhava a votação por um telão fora do plenário. ”Eu fui buscar energia”, afirmou o parlamentar.

* Após 30 minutos de defesa na tribuna, Guimarães desceu suado e um militante do PT levou uma bandeira do PT para enxugar seu rosto. ”Se enxuga com o manto”, disse o militante.

* Sônia Braga, ex-presidente do Diretório Estadual do PT, chorou após o resultado que inocentou Guimarães. ”Eu só tenho a agradecer aos deputados e aos militantes e dizer que o momento é de justiça”, disse.

* Apenas os deputados ficaram no Plenário durante a votação. Assim que a Mesa anunciou oficialmente o resultado a favor de Guimarães, repórteres, cinegrafistas e fotógrafos ficaram presos por instantes na sala de imprensa, que foi trancada devido à votação. ”Abre essa porta”, gritavam alguns profissionais.

* Marcos Cals convidou o presidente da Câmara Municipal de Fortaleza, Tin Gomes (PHS), a acompanhar, junto à Mesa Diretora da Assembléia, os trabalhos legislativos. O vereador aceitou o convite e ficou cerca de meia hora junto aos deputados.

* Na hora de votar as emendas do Orçamento, antes do pedido de cassação, o deputado Nelson Martins (PT) esqueceu sua senha que consolidaria seu voto no painel. Ele pediu para o presidente Marcos Cals registar seu voto manualmente. Alguém gritou: ”tenta 13-13”.

* A grande quantidade de pessoas presentes em plenário fez com que a temperatura se elevasse no período da tarde. O vice-presidente da Assembléia, deputado Idemar Citó (PSDB), era um dos que mais se abanavam com folhas de papel.


CASO GUIMARÃES

9 DE JULHO DE 2005
Adalberto Vieira, secretário de organização do PT estadual e assessor de José Guimarães é preso em São Paulo quando tentava embarcar com quase meio milhão de reais escondidos na cueca e na mala.

11 DE JULHO DE 2005
Dirigentes do PT pressionam o deputado para que ele se afaste dos cargos que ocupa no Diretório e na Executiva estadual. O ex-assessor Adalberto Vieira é afastado da direção do partido.

15 DE JULHO
O deputado é convocado a se apresentar no prazo de cinco dias à mesa diretora da Assembléia Legislativa para prestar esclarecimentos sobre o envolvimento de seu então assessor com o dinheiro apreendido em Congonhas.

21 DE JULHO DE 2005
O ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares, revela em depoimento à CPI dos Correios que a campanha ao governo do Ceará em 2002 recebeu recursos não incluídos na contabilidade oficial. José Airton, o ex-candidato, nega o caixa 2.

3 DE AGOSTO DE 2005
José Guimarães aparece entre os 31 nomes grifados nas anotações da gerente financeira de Marcos Valério, Simone Vasconcelos. O impacto das declarações de Delúbio alimenta especulações sobre uma renúncia de Guimarães.

4 DE AGOSTO DE 2005
Guimarães admite ter recebido R$ 250 mil de Delúbio Soares para pagar dívidas da campanha ao Governo do Estado em 2002.

5 DE AGOSTO DE 2005
Guimarães protocola defesa tanto do caso ”dólares na cueca” quanto do caixa 2 no Conselho de Ética da Assembléia.

1º DE SETEMBRO
Os R$ 250 mil recebidos por Guimarães são contabilizados na prestação de contas do PT junto à Justiça Eleitoral.

15 DE SETEMBRO DE 2005
O Procurador Regional Eleitoral, Oscar Costa Filho, considera contraditória a retificação de contas de campanha de 2002 do PT. O ex-candidato José Airton se recusa a assinar a retificação.

16 DE SETEMBRO DE 2005
Guimarães entrega defesa ao Conselho de Ética afirmando que recebeu o dinheiro não-contabilizado para pagar as contas como ”militante” e não como parlamentar.

4 DE OUTUBRO DE 2005
O ouvidor da Assembléia, deputado Antônio Granja, emite parecer pedindo a suspensão por 30 dias do mandato de José Guimarães (PT), mas deixa em aberto a possibilidade da punição evoluir para um pedido de cassação.

6 DE OUTUBRO DE 2005
O Conselho de Ética da Assembléia aprova a abertura de processo disciplinar contra o deputado José Guimarães. Artur Bruno (PT) entrou com recurso para que prevaleça no parecer aprovado apenas a suspensão de Guimarães por 30 dias.

18 DE OUTUBRO DE 2005
Em depoimento à Subcomissão do Conselho de Ética, José Airton responsabiliza Guimarães pelo caixa 2.

8 DE NOVEMBRO DE 2005
Em depoimento à Subcomissão, José Guimarães diz que não sabia da proveniência dos R$ 250 mil, já que negociava diretamente com o tesoureiro Delúbio Soares. Em nota, o PT nega registros do repasse de R$ 250 mil.

2 DE DEZEMBRO DE 2005
Com o argumento de que o Diretório Nacional do PT não assumiu a remessa do dinheiro, o relator do caso no Conselho de Ética, Moésio Loiola (PSDB), pede a cassação de Guimarães. Mas a subcomissão acabou aprovando emenda de Artur Bruno que sugere a suspensão do mandato por 30 dias.

9 DE DEZEMBRO
O pleno do Conselho de Ética decide pela cassação de Guimarães. O PT tem 24 horas para recorrer da decisão em plenário.

10 DE DEZEMBRO
Oposição tenta retardar a votação do caso Guimarães no intuito de levar o assunto para 2006, ano eleitoral. O líder do PSB, Ivo Gomes, promete protelar a votação do Orçamento enquanto não houver o julgamento.

17 DE DEZEMBRO
Governo cede a um acordo com a oposição e agenda o julgamento do petista para o dia 20. O líder da bancada tucana na Assembléia, deputado João Jaime, anuncia que o partido fechou questão a favor da cassação de Guimarães