Promotores reivindicam nomeação de defensores
A garantia do exercício da cidadania por parte de populações desassistidas do Interior do Estado motivou um grupo de 29 promotores de Justiça a ingressar com ações civis públicas no sentido de garantir a nomeação de defensores públicos para comarcas que não dispõem da Justiça gratuita.
A exigência de pelo menos um promotor por comarca está sacramentada na Constituição do Estado. Em outras épocas, a lei garantia um defensor por vara. Nem ontem nem hoje a determinação é cumprida no dia-a-dia. O resultado é a negação sistemática do acesso à Justiça aos mais necessitados.
“Oferecer o serviço da Defensoria à população do Interior é complementar o exercício da cidadania, que se dá muitas vezes pelo ajuizamento de ações e, na maioria dos Municípios do Estado, tem sido mitigado”, sentencia o promotor de Justiça de Ipueiras, Haley de Carvalho Filho, um dos que ingressaram com ação na Justiça para garantir o provimento de defensor na comarca em que atua.
Em três Municípios do Estado, a iniciativa dos promotores em exigir o cumprimento da lei já surtiu efeito. Os juízes de Umirim, Santa Quitéria e Parambu concederam liminares garantindo a implantação da Defensoria nessas localidades.
São 163 os Municípios, dentre os 184 que compõem o Ceará, sem defensor público. A ausência da figura do defensor nunca é substituída à altura, na avaliação de Carvalho. Quando o Ministério Público assume essa função, muitas vezes não está habilitado a cumpri-la de forma plena, por exemplo em casos envolvendo acusados de crimes. Nesses casos, o MP tem a função de indicar elementos de acusação, e não promover defesa. Matérias como o questionamento de tributos municipais também escapam à competência do Ministério Público.
A função constitucionalmente reservada ao Ministério Público prevê sua atuação em defesa dos interesses difusos, coletivos, enquanto a Defensoria tem como perfil a defesa de causas individuais. Matérias como divórcio, assistência a crianças e adolescentes em situação de risco, acompanhamento de detentos e defesa do consumidor carente estão sob a responsabilidade do defensor.
Na lacuna deixada pela restrição no atendimento da Defensoria, surgem distorções como a contratação de advogados, por parte das Prefeituras municipais, para prestar assistência jurídica à população. Em muitos casos sem condições de arcar com honorários de advogados – que em muitas localidades sequer existem -, essas pessoas recorrem ao auxílio oferecido pelo Executivo.
A contrapartida, no entanto, é alta: muitas vezes predomina o uso do benefício como moeda política e torna-se impossível levar Prefeitura à Justiça, quando necessário. A Defensoria, por sua vez, tem garantia de independência na sua atuação.
As ações desse grupo de promotores acontece, em geral, de forma coordenada, visando a minimização de problemas de alcance amplo no Estado. Nesse sentido, destaca-se a ação conjunta do grupo no Estado em relação ao combate ao nepotismo.
São 29 os Municípios cearenses em que há conhecimento de ações civis públicas para garantir a presença de defensor público. Segue a relação:
Municípios cujos promotores cobraram judicialmente a nomeação de defensores públicos
– Aratuba
– Caridade
– Cariré
– Caririaçu
– Chorozinho
– Crato
– Graça
– Hidrolândia
– Horizonte
– Icapuí
– Ipueiras
– Itaitinga
– Itapipoca
– Itarema
– Jaguaretama
– Jaguaribe
– Mauriti
– Milagres
– Orós
– Parambu
– Pindoretama
– Reriutaba
– Russas
– Saboeiro
– Santa Quitéria
– São Luís do Curu
– Solonópole
– Trairi
– Umirim
Fonte: Associação Cearense do Ministério Público
Perfil comparativo da atuação do Ministério Público e da Defensoria Pública
—- > Ministério Público
– Tem como função básica a defesa da sociedade como um todo. É ainda fiscal da lei. É incumbido da proteção da ordem jurídica e do regime democrático.
– Está presente em ações de caráter coletivo. Exemplos: ações em defesa do meio ambiente, do idoso, em defesa do consumidor enquanto categoria, de improbidade administrativa e ações civis públicas em geral.
– Na ação penal, é o titular, cumprindo portanto papel de acusador.
—- > Defensoria Pública
– Tem como função básica efetivar o princípio da proteção jurisdicional, isto é, garantir o acesso da população desassistida à Justiça, com foco na orientação e patrocínio de seus direitos e interesses.
– Está presente em ações de caráter individual. Exemplos: separação judicial, divórcio, ações de cobrança, investigação de paternidade, e ações contra o poder público, entre outras em que o indivíduo não tenha condições de custear os serviços de um advogado.
– Promove a defesa de acusados em ações criminais.
Fonte: Associação Cearense do Ministério Público e Constituição Estadual
Outras informações
– Nas decisões liminares, alguns juízes estabeleceram o pagamento de multa, por parte do governo estadual, como punição pela ausência de defensores. No caso de Ipueiras, o juiz Francisco Eduardo Fontenele Batista determinou multa de R$ 5 mil por cada dia sem defensor indicado, prazo contado a partir de 30 dias da decisão. A ação foi ajuizada pelo promotor Haley Carvalho Filho.
Em Caridade, ação da promotora Lucy Antoneli Domingos Araújo resultou em decisão judicial prevendo pagamento de multa de R$ 8 mil ao dia. A sentença foi concedida pelo juiz Leonardo Augusto Nunes Coutinho. Essa comarca chegou a passar um mês sem sequer um advogado para atender a população, segundo a promotora.
– Alguns promotores registram a preocupação de que a chegada de 60 novos defensores para o Estado (nomeados após concurso) não represente uma melhora significativa no problema da falta de defensores. Segundo Lucy Araújo, de Caridade, não haverá nomeação de defensores para comarcas de primeira entrância, em que se verifica as maiores demandas por parte da população pobre.
Baseada em comunicação oficial do defensor-geral Luciano Hortênsio de Medeiros, a promotora questiona justificativa dada por ele para a nomeação de defensores exclusivamente em segunda e terceira entrâncias. A alegação é de que em tais comarcas há maior movimentação processual.
“Chamamos a atenção para a necessidade da primeira entrância. Nem sempre o movimento processual repercute no trabalho do defensor. A pobreza da população a ser assistida deveria ser o critério preponderante”, assinala.