Passado um ano da promulgação da lei, aumenta número de denúncias registradas por mulheres vítimas de maus tratos. Leia mais
Os óculos escuros escondem as marcas dos maus-tratos, mas não apagam a dor. É o amor que virou ódio, a bebida que provoca a ira ou o cotidiano que eleva a raiva. Não importa o motivo, é sempre a mulher que sai machucada. Em vez de se resguardarem atrás do estigma do sexo frágil, elas estão mais corajosas. Depois de um ano de vigência da Lei Maria da Penha, não só o número de denúncias de violência aumentaram na Delegacia de Defesa da Mulher em Fortaleza como também o de inquéritos policiais e de agressores presos.
Antes da Lei entrar em vigor, de janeiro a julho do ano passado, a Delegacia de Defesa da Mulher registrou 4.715 ocorrências. Este ano, já foram contabilizadas 6.279 denúncias. Ao longo de um ano de validade da Lei Maria da Penha, 706 inquéritos policiais foram encaminhados ao Fórum e 400 homens foram presos.
O salto numérico não representa um aumento da violência contra a mulher, mas sim os resultados da lei de proteção, é o que frisa a titular da Delegacia de Defesa da Mulher em Fortaleza, Rena Gomes. “O aumento se deu em razão da credibilidade da mulher”, diz a delegada.
Resguardadas por uma ferramenta jurídica mais completa e com os benefícios de uma rede de proteção, muitas mulheres estão saindo do silêncio e denunciando. A delegada avalia que um dos principais benefícios trazidos pela Lei Maria da Penha são as medidas protetivas de urgência, que são aplicadas no instante em que as vítimas procuram a Delegacia.
Essas medidas incluem a solicitação do afastamento do agressor do lar; do distanciamento físico entre o agressor, a mulher, os filhos ou mesmo as testemunhas; e também a solicitação de pensão alimentícia.
Para quem é vítima de violência doméstica, ter acesso a essas medidas na própria delegacia é um alento, que o diga a doméstica Sandra (nome fictício), que não pôde contar com as vantagens da Lei quando resolveu denunciar os maus-tratos do ex-marido. “Se na época houvesse essa lei eu não teria sofrido tantas agressões”, reflete Sandra.
A doméstica se separou há três anos, o marido responde a um processo e ela procurou a Delegacia de Defesa da Mulher mais uma vez para registrar um boletim de ocorrência pelo atraso do pagamento da pensão alimentícia dos cinco filhos há mais de um ano.
“Eu me separei, mas ainda continuo sendo humilhada por ele”, conta. Em 2004, quando Sandra realizou a denúncia contra o marido, não pôde mais voltar para casa, pois ele havia comprado um punhal com o intuito de matá-la.
Ela só teve coragem para ir à delegacia porque contou com o apoio de familiares e de sua ex-patroa, que a ajudou a sair de casa e recomeçar a vida.
“Eu tive pessoas boas que me ajudaram, mas quem não tem? Vai contar com quê?”, questiona a doméstica, que relata casos de violência. A Lei Maria da Penha também oferece esse suporte para as vítimas.
Ela exige a formação de uma rede de apoio, que na Capital é composta por duas casas abrigos, uma do Estado e outra da Prefeitura, dois Centros de Referência e Atenção à Mulher.
O que diz a Lei
Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do º 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.
São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:
I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada;
IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos;
V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade a pena é de detenção de três meses a três anos.
Maria da Penha
Inspirada pela biofarmacêutica cearense Maria da Penha Maia, que lutou durante 20 anos para ver o agressor condenado, e virou símbolo contra a violência doméstica. Em 1983, ela recebeu um tiro nas costas do marido, Marco Antonio Herredia, e ficou paraplégica. Em 2001, após 18 anos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos responsabilizou o Brasil por negligência e omissão em relação à violência doméstica. Somente em 2003, o ex-marido de Penha foi preso.
Fonte: www.planalto.gov.br
TJ cria novos Juizados da Mulher
– Para comemorar o primeiro ano da Lei Maria da Penha, serão criados dois Juizados Especiais de Violência contra a Mulher – um em Fortaleza e outro em Juazeiro do Norte, na Região do Cariri.
– Por iniciativa do Tribunal de Justiça, o Projeto de Lei que trata da criação dos dois novos equipamentos, já foi aprovado pela Assembléia Legislativa e está nas mãos do governador Cid Gomes para ser sancionado. O juizado especial é exigência da lei Maria da Penha.