Promotor Marcus Amorim escreve sobre recurso privativo da defesa, cabível quando o réu é condenado a uma pena igual ou superior a 20 anos de reclusão. Leia íntegra As especulações sobre os desdobramentos judiciais do caso Isabella Nardoni, mas principalmente, a recente reviravolta no processo dos acusados da morte de Dorothy Stang, em Belém, quando o fazendeiro apontado como mandante da execução da missionária foi absolvido num segundo julgamento, fizeram lembrar à sociedade e aos parlamentares em Brasília a necessidade de extirpar uma excrescência do nosso sistema recursal no processo penal chamada “Protesto por Novo Júri”. Isso está prestes a acontecer, já que a Câmara dos Deputados acaba de aprovar o PL n.º4203, de 2001, que altera o procedimento dos crimes de competência do Tribunal do Júri Popular. A matéria seguiu para sanção presidencial.

O Protesto por Novo Júri é um recurso privativo da defesa, cabível uma única vez quando o réu é condenado a uma pena igual ou superior a 20 anos de reclusão. Não há aqui nenhuma objeção ao conteúdo do veredito dos jurados ou contestação à sentença proferida pelo magistrado diante de um crime de homicídio. Simplesmente a defesa do réu pede um novo julgamento perante o Tribunal do Júri Popular em razão da grave pena aplicada. Isso significa que, para ser rigoroso e firme na punição de um homicida, é preciso fazê-lo, pelo menos, duas vezes. Mas o caso do mandante da morte de Dorothy Stang nos mostra que nem sempre isso se concretiza.

De modo estranho, a jurisprudência dos tribunais, inclusive o STF, vinha rejeitando esse recurso nas situações de concurso material de crimes, isto é, quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais delitos, de idêntica natureza ou não. Trocando em miúdos: se um réu é condenado por dois homicídios, com pena de 15 anos para cada um deles, não tem direito a esse recurso. Mas se a condenação é de 20 anos por um único homicídio, aí sim, basta requerer um novo julgamento. Parece evidente que isso, no fundo, não faz sentido.

O Protesto por Novo Júri sempre gerou resistência no meio jurídico. Há notícias de que juízes preferiam aplicar uma pena de 19 anos e tantos meses, embora a culpabilidade do réu os levasse a um patamar mais elevado, somente para não dar ensejo a tal recurso. A sua extinção no nosso sistema processual veio, portanto, em boa hora: um jurado, cuja presença no conselho de sentença é um serviço público obrigatório e não remunerado, certamente não gostaria de saber que sua participação não serviu para nada. A sociedade brasileira, afinal, tem dado sinais claros de que não mais tolera leniência, comiseração ou displicência com aqueles que cometem crimes graves.