A Carta garantiu autonomia administrativa e funcional ao Ministério Público e ampliou as funções do órgão. Com isso, MP ganhou visibilidade
Nenhuma instituição conquistou mais importância e visibilidade a partir da Constituição de 1988 do que o Ministério Público, avalia a cientista política Maria Tereza Sadek. A Carta de 1988 ampliou os direitos da cidadania, e o MP mereceu capítulo próprio como instituição independente do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Na Constituição de 1934, era um dos “órgãos de cooperação das atividades governamentais”, ao lado do Tribunal de Contas. Na de 1967, estava ligado ao Judiciário. Na Emenda de 1969, ao Executivo.
A Constituição de 1988 deu autonomia administrativa e funcional ao MP, com garantias semelhantes às do Judiciário: “O MP deixou de ser advogado dos interesses do Estado para converter-se em defensor dos interesses da sociedade”. Suas funções foram ampliadas. Em 20 anos, multiplicou-se por três o número de procuradores.
“As disposições da Constituição de 1988 asseguram tranqüilidade na atuação rigorosa e independente da instituição no combate ao crime”, diz a procuradora Janice Ascari: “Nestes 20 anos, autoridades de todos os Poderes e do próprio MP, incluindo o presidente, foram levadas ao banco dos réus”.
Além das suas atribuições tradicionais voltadas para a ação penal, cresceu o papel do MP na defesa de direitos sociais, individuais, difusos ou coletivos. Nestas duas décadas, foi a instituição que mais utilizou a ação civil pública, um instrumento jurídico poderoso. Sadek destaca ainda o controle da probidade administrativa, da moralidade pública na fiscalização de agentes políticos. Na prática, porém, o MP continua uma organização monocrática: “Não tem uma hierarquia baseada em princípios de mando e obediência”, diz Sadek.
A subordinação ao chefe é só de natureza administrativa, diz Sadek. Cada membro do MP é livre para atuar segundo sua consciência – o que abre espaço para a “vontade política”.
“A nomeação pelo Executivo, por si só, não é um indicador suficiente para determinar a atuação do chefe da instituição, seja no Ministério Público da União, seja no dos Estados”, diz Sadek. O procurador-geral Geraldo Brindeiro, que ficou conhecido como “engavetador”, não oferecia denúncias ao Supremo, mas não interferia nas ações dos procuradores. Foi o período dos holofotes em torno de “missionários”, como Luiz Francisco de Souza, luzes apagadas por Cláudio Fonteles, que virou a “voz única” do órgão. O sucessor, Antônio Fernando Souza, marcou seu estilo com a denúncia do mensalão.
Mas a capacidade efetiva de o MP cumprir suas atribuições é limitada. “O Judiciário e a polícia podem tanto facilitar como dificultar ou mesmo impedir o andamento de uma investigação ou de uma ação”, diz Sadek.
“Apesar dos esforços do MP, nunca houve tanta impunidade”, diz Janice. “As causas possíveis são a possibilidade quase infinita de recursos, a banalização do sagrado habeas corpus, o foro especial por prerrogativa de função, o afrouxamento dos valores jurídicos, morais e éticos de algumas autoridades diante de delinquentes poderosos e a interpretação claramente casuística dada às normas em certos episódios, especialmente pelo STF”, diz Janice.