Artigo: Uso de algemas

O Tema “Uso de Algemas!”, tem sido um dos mais discutidos nos últimos dias, tanto pelos operadores do Direito em todas as áreas, como também por profissionais de outras categorias como sociólogos, psicólogos, autoridades de Segurança Pública.

Toda essa celeuma deve-se ao fato de o Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 13.08.2008, ter editado Súmula Vinculante nos seguintes termos:

  Só é lícito o uso de algemas em  casos  de  resistência  e  de fundado receio de  fuga  ou  de  perigo  à  integridade  física   própria   ou   alheia,   por   parte   do  preso  ou  de   terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob   pena de  responsabilidade  disciplinar,  civil  e  penal  do  agente ou da autoridade e de nulidade da  prisão  ou  do  ato processual a que se refere, sem prejuízo da  respon-  sabilidade civil do Estado. 

Por esta iniciativa o Supremo Tribunal Federal (STF) já recebeu as três primeiras ações que sobre violação à súmula vinculante que limita o uso de algemas a casos excepcionais. As reclamações contestam ordens judiciais de magistrados de Brasília e da cidade-satélite de Ceilândia, que mantiveram o uso das algemas para a realização de audiências de instrução.

O Sindicato da Polícia Federal do Distrito Federal (Sindipol-DF) impetrou habeas corpus junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo a suspensão dos efeitos de referida súmula vinculante nº 11.

Para Alexandre de Moraes, ex-promotor de Justiça (SP) e ex-conselheiro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), “estamos vendo fantasmas onde não há. O Poder Judiciário está atuando mais contra a súmula do que contra o seu conteúdo. Não há ainda no Brasil uma cultura de respeito a súmulas vinculantes. Elas ainda estão sendo digeridas. O fato é que o STF aproveitou a prisão do banqueiro Daniel Dantas para editar a súmula nº 11. É preciso que se aplique o mecanismo da distinção, ou seja, o juiz deverá analisar a súmula e também os precedentes que deram origem a ela ao tomar cada decisão. Acredito que em pouquíssimos casos o STF anulará atos judiciais por conta da desnecessidade do uso de algemas no tocante à sumula, a qual certamente será reduzida se o Poder Legislativo criar uma lei contrária a ela”.

O art. 199 da Lei de Execução Penal sinalizou em seu regramento que “O emprego de algemas será disciplinado por decreto federal”, providência até hoje não adotada.

Temos notícias de que no Estado de São Paulo, há muito tempo, existem normas específicas regulamentando o uso de algemas, com excelentes resultados práticos. Não há dúvida que constitui fonte de enorme insegurança a falta de um regramento nacional específico sobre cada matéria. Para se precaver de possíveis prisões de seus agentes, a Guarda Municipal de Americana (SP) ingressou com habeas corpus preventivo no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a súmula vinculante que restringiu o uso de algemas a casos excepcionais. O objetivo da corporação é evitar que os guardas municipais sofram processos penais caso não justifiquem imediatamente o uso das algemas. No mesmo sentido o Ministério Público do Rio Grande do Norte também encaminhou ao STF, mês passado, habeas corpus contra a restrição do uso de algemas por policiais no país. Alegando que “a súmula é mais rigorosa que a própria lei penal” em relação a eventual abuso de poder, os promotores impetraram habeas corpus preventivo, com pedido de liminar, em favor de todos os policiais civis, militares e agentes penitenciários do Estado, contra o “constrangimento ilegal” decorrente de “ato inconstitucional e desprovido de razoabilidade do próprio Supremo”. Para os autores do pedido, a súmula é uma “indevida incursão na seara legislativa”.

Tramita na Câmara dos Deputados projeto de Reforma do CPP (desde 2002), que diz em seu art. 474: “Não se permitirá o uso de algemas no acusado durante o período em que permanecer no plenário do júri, salvo se absolutamente necessário à ordem dos trabalhos, à segurança das testemunhas ou à garantia da integridade física dos presentes”.

Em nossa modesta opinião, o uso de algemas deve ser avaliado no caso concreto pela autoridade que preside o ato. Seja ele de Polícia Judiciária, Polícia ostensiva (PM) ou ato jurisdicional. Temos exemplos de vários casos de juízes, promotores de justiça e até mesmo advogados e defensores públicos que foram agredidos em salas de audiências. No Ceará, nas comarcas de Maracanaú e Caucaia, temos exemplos de Juízes e Promotores que, por não tomarem as cautelas devidas, sofreram tentativas de crimes contra a vida.

Tudo se resume na boa aplicação do princípio da proporcionalidade, que exige adequação, necessidade e ponderação da medida.. Em todos os momentos em que (a) não patenteada a imprescindibilidade da medida coercitiva ou (b) a necessidade do uso de algemas ou ainda (c) quando evidente for seu uso imoderado, há flagrante violação ao princípio da proporcionalidade, caracterizando-se crime de abuso de autoridade.. Cada caso concreto revelará o uso correto ou o abuso. Lógico que muitas vezes não é fácil distinguir o uso lícito do uso ilícito. Na dúvida, todos sabemos, não há que se falar em crime. De qualquer modo, o fundamental de tudo quanto foi exposto, é atentar para a busca do equilíbrio, da proporção e da razoabilidade.

Acima do STF não existe instância jurisdicional que possa reavaliar suas decisões. Daí sua decisão ser terminativa, esgotou todo limite jurisdicional. Concordamos com o ponto de vista do “Parquet” Potiguar: a “súmula é mais rigorosa que a própria lei penal”. Houve também, a nosso ver, invasão da esfera legislativa porque criou um tipo punitivo, coisa que só o Poder legislativo poderia fazer. Cremos que esta súmula se não for revogada, poderá até permanecer vigente, porém, sua eficácia terá curta duração.