O trabalho mobilizou Promotores de Justiça, delegados, peritos e juízes das 27 unidades da federação na análise de inquéritos sobre homicídios instaurados ainda sem solução.
O resultado da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública (Enasp) – Meta 2 foi divulgado, nesta quarta-feira (13), pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), juntamente com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Ministério da Justiça. O presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), César Mattar Jr., e a 1ª vice-presidente da entidade, Norma Angélica Cavalcanti, os presidentes da Associação do Ministério Público do Rio de Janeiro (Amperj), Marfan Martins Vieira, e da Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT), Antonio Marcos Dezan, e o vice-presidente da Associação do Ministério Público do Rio Grande do Sul (AMP/RS), Sérgio Hiane, acompanharam a divulgação dos resultados. Também estiveram presentes autoridades do MP, do Judiciário e parlamentares.
Assinada em fevereiro de 2010 pelo CNMP, CNJ e MJ, a Enasp tem entre suas metas a conclusão dos inquéritos sobre homicídios instaurados até 31 de dezembro de 2007. Devido à iniciativa, prováveis autores de 8.287 homicídios vão agora prestar contas desses crimes. Eles foram denunciados à Justiça e serão julgados no Tribunal do Júri. O trabalho mobilizou promotores, delegados, peritos e juízes das 27 unidades da federação na análise de inquéritos sobre homicídios instaurados ainda sem solução. Essas investigações estavam sem perspectiva de conclusão e a tendência era que os crimes prescrevessem pelo decurso do tempo.
O relatório Meta 2: A impunidade como alvo traz o resultado da mobilização nacional para conclusão de mais de 130 mil inquéritos antigos de homicídios e traça um diagnóstico inédito das maiores dificuldades para a elucidação desses crimes no Brasil. Em um ano, o trabalho coordenado pelo Grupo de Persecução Penal da Enasp resultou em mais de oito mil denúncias, cerca de 100 mil inquéritos baixados para diligências e mais de 150 mil movimentações de procedimentos antigos.
O relatório traz também pesquisa que identifica problemas principalmente na estrutura de pessoal e de equipamentos das Polícias Civis, nas formas de comunicação entre Ministério Público e Polícia, no fluxo da persecução penal e na capacitação dos agentes. As análises foram feitas com base em questionário respondido pelos gestores do Ministério Público e da Polícia Civil em cada estado.
Ao apresentar o resultado, a presidente em exercício do CNMP, Débora Duprat, ressaltou que a “Enasp é uma quebra de paradigmas do poder judiciário como também do Ministério Público e que esta quebra de paradigmas decorre da compreensão que temos responsabilidades com a sociedade e que devemos assumi-las”.
Taís Ferraz, conselheira do CNMP e coordenadora do Grupo de Persecução Penal da Enasp, afirmou que é preciso integrar o Ministério Público, a polícia, o Ministério da Justiça na efetividade ao combate à violência. Também garantiu que “se os estados souberem dar resposta a tempo, conseguiremos diminuir os crimes”. Agradecendo pelo trabalho feito e pela dedicação do grupo, ela ressaltou que muito foi avançado com relação aos inquéritos, mas que ainda há muito para melhorar e avançar.
Já o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, destacou que o combate à violência no Brasil é uma questão de Estado e passa pela união de todos os Poderes. “Para que a situação da criminalidade melhore é preciso reforçar a perícia, capacitar os policiais e melhorar os equipamentos, pois o Estado brasileiro é mais forte do que a criminalidade, só é preciso melhorar alguns pontos e juntar esforços”, explicou, ressaltando ainda que nem sempre a redistribuição de renda diminui a criminalidade, mas que o grande mentor dela é a sensação de impunidade.
Para encerrar, o presidente do CNJ, Carlos Ayres Britto, salientou que é preciso trabalhar inspiradamente e motivadamente para melhorar os resultados. “Cabe-nos atuarmos de forma firme, termos independência política e, principalmente, honestidade ética”.
Levantamento
De acordo com a Meta 2 da Enasp, em 18 estados brasileiros há carência de pessoal nas delegacias de Polícia especializadas em homicídios. Em 12, não houve aumento do quadro da Polícia Civil nos últimos dez anos. Os concursos são feitos apenas para provimento de vagas já existentes e, em oito estados, as seleções foram realizadas, mas não houve convocação dos aprovados.
Na distribuição de delegados por habitantes, o Amapá lidera o ranking (19,72 por 100 mil habitantes). São Paulo está em 7º (7,59), Minas em 10° (6,68) e Rio Grande do Sul em 17° (5,18). Alagoas está na última posição (2,44 delegados para cada 100 mil habitantes).
No número de peritos por habitantes, Mato Grosso do Sul está em primeiro lugar (cerca de 18,37 para cada 100 mil). Os que possuem menos de dois peritos por 100 mil habitantes são Ceará, Pará, Espírito Santo, Maranhão, Alagoas, Rio Grande do Norte e Piauí.
No item relacionamento entre MP e Polícia, o estudo mostra que a tramitação direta de inquéritos entre Polícia Civil e Ministério Público é feita em 15 estados brasileiros. Em 11 estados, ainda há intermediação do Judiciário na tramitação do inquérito, mesmo para medidas simples, como pedido de extensão prazo ou comunicado sobre inviabilidade de produção de prova. A situação “não raro, resulta em paralisação da investigação por 20, 30 e até 90 dias”, diz o relatório.
Propostas de solução
A necessidade de nivelamento de conhecimentos e de troca de informações entre os diversos agentes envolvidos na tarefa de elucidar os homicídios foi reconhecida no estudo como um dos grandes desafios.
O Grupo de Persecução Penal da Enasp, que reúne promotores, delegados, juízes, defensores e peritos, construiu programa e metodologia de curso de capacitação interinstitucional, que já começou a ser reproduzido em alguns estados, como Espírito Santo e Sergipe. O curso permanente é destinado a membros das instituições envolvidas na persecução penal e na ação penal de crime de homicídio. Entre os diversos objetivos é possível destacar a necessidade de que as instituições se conheçam nas suas competências, carências, demandas e potencialidades, que busquem atualização permanente e que a comunicação seja simplificada e contínua, entre outras.
O documento traz medidas de curto, médio e longo prazo para sanar os problemas identificados. Entre as propostas, estão a implantação de meritocracia, a formação e a manutenção de forças-tarefas nos estados, a padronização de laudos periciais e a otimização de quesitos, a implantação dos departamentos de homicídio e proteção à pessoa nos estados que não contam com essa estrutura, entre outras.
Já o Ministério da Justiça está na fase final de elaboração de um plano para redução da impunidade dos crimes de homicídio. Em parceria com todos os estados e o DF, assim como Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública, o foco será no aperfeiçoamento da investigação, por meio da aquisição de equipamentos, capacitação de peritos e criação de Departamentos de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPPs), além do monitoramento constante do julgamento de processos de homicídio pelo Poder Judiciário. A situação do nosso país é alarmante: é muito baixa a elucidação do crime de homicídio e, com isso, a impunidade se torna incentivo ao crime”, avalia o ministro José Eduardo Cardozo.
Desempenho
Acre, Roraima, Piauí, Maranhão, Rondônia e Mato Grosso do Sul alcançaram os melhores resultados no cumprimento da Meta 2.
O Acre teve o melhor desempenho, com 100% de inquéritos concluídos. Roraima, Piauí e Maranhão tiveram, respectivamente, 99,58%, 98,14% e 97,36% das peças finalizadas, enquanto Rondônia e Mato Grosso do Sul ficaram com 94,67% e 90,24%.
Foi definido que, para ter a meta cumprida, seria necessário concluir 90% dos inquéritos levantados inicialmente. O ponto de corte foi estabelecido para não estimular, de qualquer forma, o arquivamento de investigações ainda viáveis.
Os estados com pior desempenho na execução da Meta 2 foram Minas Gerais (3,24%), Goiás (8,09%) e Paraíba (8,83%). O relatório analisa a situação dos estados a partir de conjunto de indicadores levantados na execução da Meta 2, incluindo propostas de monitoramento e de medidas para melhorar o desempenho.
Nova meta
Para este ano, a meta vai englobar, além do estoque remanescente de inquéritos de 2007, aqueles instaurados até dezembro de 2008 e sem conclusão. Os gestores estaduais da Meta 2 da Enasp terão um ano para identificar a quantidade de inquéritos nessa situação, separá-los dos demais e retomar do ponto onde pararam. “A proposta para os inquéritos da nova Meta 2 é ampliar este monitoramento, para que seja possível a obtenção de dados mais sofisticados sobre as principais causas de arquivamento e causas dos próprios crimes de homicídios”, diz o relatório.
Fonte: Conamp