Apesar da expectativa popular, a nova Lei ainda pode permitir a candidatura de políticos investigados por desvio.

Terminado o prazo para o registro das candidaturas no último dia 5 de julho, o Ministério Público (MP) Eleitoral inicia a análise da vida pregressa dos candidatos para propor ações pedindo a inelegibilidade dos chamados fichas sujas. Apesar da expectativa da população em relação à aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa neste ano, o procurador regional eleitoral Márcio Torres lembra que a nova legislação só abrange os casos com decisão de órgãos colegiados e, portanto, pode permitir a candidatura de políticos sob investigação por crimes contra o erário.

“Enquanto não houver essa decisão condenatória por pelo menos um órgão colegiado, aquela decisão feita é só cautelar e penal, portanto não torna inelegível o político”, explica o procurador Márcio Torres, acrescentando que a inovação da Lei da Ficha Limpa é no sentido de que antes só se tornavam inelegíveis aqueles julgados e condenados e, hoje, a decisão de um órgão colegiado já pode provocar a inelegibilidade.

Recentemente, alguns prefeitos cearenses chegaram a ser detidos por suposto envolvimento em crimes contra o patrimônio público. O prefeito e o vice de Senador Pompeu, por exemplo, chegaram a ficar presos durante seis meses para não atrapalhar as investigações. O caso mais recente é o do prefeito de Ipu, que, acusado de envolvimento no desvio de R$ 3,1 milhões destinados à construção de kits sanitários, foi solto por uma decisão liminar do Superior Tribunal de Justiça. Porém, o fato de esses gestores estarem sendo investigados por desvio de verbas públicas não garante que sejam enquadrados na Lei da Ficha Limpa.

“Pela Lei da Ficha Limpa, é como se não fossem condenados. Alguns desses casos não têm nem a denúncia feita ainda, como é o caso de Ipu. E, mesmo que tivesse, tem ainda o prazo de defesa, de ouvir as testemunhas”, explica o procurador Márcio Torres. Ele reconhece que isso pode frustrar o eleitorado, mas acrescenta que não tem como agir diferente do que determina a Lei. “Vai caber ao eleitor fazer o controle das candidaturas, não votando no candidato que tem desprezo pelo dinheiro público”, afirma.

Listas

A Justiça Eleitoral recebeu as listas dos Tribunais de Contas em que constam os gestores que tiveram contas rejeitadas. As listas do TCU, TCE e TCM somam 3.904 nomes, mas um mesmo político pode estar em mais de uma relação. Conforme explica Márcio Torres, a análise da vida pregressa dos candidatos não se limita a essas listagens. Ele informa que, a partir dos pedidos de registro de candidatura, é feita uma pesquisa nos bancos de dados disponíveis para averiguar se aquele candidato já sofreu alguma condenação que possa provocar sua inelegibilidade.

Dentre as principais causas previstas na Lei da Ficha Limpa, estão as práticas de crimes de improbidade, ilícitos eleitorais criminais ou civis e os casos de demissão ou infração no serviço público. “Então, fazemos uma pesquisa nos sites do Tribunal Regional Federal, do Tribunal de Justiça do Ceará, do Superior Tribunal de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Militar para verificar condenações de improbidade ou outras condenações”, afirma Márcio Torres.

O procurador acrescenta que também é feita uma consulta para averiguar se o candidato já obteve alguma condenação por ilícitos eleitorais, como compra de votos ou abuso de poder econômico, por exemplo. Por último, afirma Márcio Torres, é feita a análise das rejeições de contas daqueles candidatos que já foram gestores públicos.

Após finalizado o trabalho de análise de cada um dos candidatos, Márcio Torres afirma que o MP Eleitoral divulgará uma lista de impugnados. A partir da publicação dos editais referentes às candidaturas, cuja maioria deve ser publicada hoje, o MP tem o prazo de cinco dias para analisar os pedidos e propor as ações de impugnação. “Tem um grupo do MP e da Caopel ajudando nessas pesquisas. Precisam ter esses dados em mãos, porque os próximos dias de intensa pesquisa”.

Julgamentos

Márcio Torres diz que não tem ainda como precisar quando essa lista de impugnações deverá ser divulgada, mas adianta que provavelmente será uma semana após o fim do prazo para os pedidos de impugnação. “Os pedidos são encaminhados ao promotor, e é ele quem decide se faz ou não a impugnação”, explica. A partir desses julgamentos, a lista será publicada.

Márcio Torres afirma que o MP não tem como deixar de acompanhar as ações de impugnação em função dos prazos determinados pela legislação eleitoral. “Quando é feito o pedido, abre-se um processo em que o candidato tem um prazo para se defender. O juiz realiza as diligencias necessárias e depois já julga. Não tem como deixar de julgar porque todos os processos têm que ter decisão em primeiro grau até o dia 5 de agosto deste ano, para que na época das eleições já haja definição sobre as candidaturas”, explica Márcio Torres. Segundo ele, após a decisão do juiz eleitoral, o candidato ou o Ministério Público tem até o final de agosto para recorrer ao TRE e, em seguida, ao TSE.

“A ideia é que tudo seja julgado rápido para realizar a eleição já sabendo da situação jurídica de alguns candidatos. No TSE, pode até acontecer algum atraso. Mas aqui na Justiça Eleitoral tem que estar julgado em agosto. Então, não existe a possibilidade de o MP deixar de acompanhar. O perigo agora está em deixarmos passar alguém que deveria ficar inelegível por conta do curto prazo, por isso criamos um grupo especial para analisar essa questão”, finaliza.

Fonte: Diário do Nordeste/CE