A ACMP esteve presente na última segunda-feira (06), na cerimônia de posse do Procurador-Geral de Justiça do Estado, Ricardo Machado. Na ocasião, o presidente Plácido Rios, discursou e cobrou maior rigor no combate à corrupção. Confira abaixo o texto na íntegra.
Em 1789, a Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão deixou consignado em seu art. 1º, que todos os homens nascem livres e iguais em direitos.
Mais do que reconhecer direitos, o texto deixou claro a necessidade de dotar o Estado de uma força independente, que viesse a garantir o respeito e observância desses mesmos direitos, inclusive e principalmente, em face do próprio Estado, assinalando em seu art. 12 que: “a garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada”.
É desta “força pública”, reconhecida como imprescindível para garantir que os direitos sejam respeitados e gozados por todos de forma equânime, que nasceu a raiz do Ministério Público contemporâneo.
Talvez surja daí a eterna incompreensão de algumas autoridades públicas com esta função independente do Estado, ínsita ao Poder estatal mas responsável por tutelar o próprio Estado, insurgindo-se muitas vezes contra governantes ou diretrizes políticas que se afastam do interesse do povo e buscam realizar interesses alheios aos preconizados pela Carta Constitucional.
Essa rápida introdução nos permite entender parte do fenômeno social ocorrido no ano passado, em 2013, ano em que a sociedade brasileira foi às ruas bradar contra um projeto de emenda constitucional que pretendia alijar o MP de sua função investigatória. Quando parte dos parlamentares brasileiros buscaram reprimir e mutilar aquela “força pública” destinada a fiscalizar o cumprimento das leis e da constituição em toda sua inteireza.
Antes disso, apenas os movimentos populares conhecidos como “Diretas Já” em 1983/84 e o “Fora Collor” em 1992, tiveram tanta participação do povo brasileiro.
No recente movimento popular de 2013, apesar de difusas as reivindicações, duas pautas mantiveram-se perenes em todos os focos da manifestação: A luta contra a corrupção, por um país mais sério e ético, e, o combate à PEC 37, resguardando o poder investigatório do MP.
Ambos os pleitos dirigidos direta ou indiretamente à nossa instituição. O primeiro, cobrando-nos mais ação e eficiência em nosso trabalho de combater a corrupção. O segundo, tutelando nossa principal ferramenta de atuação, a investigação.
Hoje vivemos a mais grave crise da história de nossa sociedade moderna, A CORRUPÇÃO. Esta pandemia (como bem conceituou a própria presidente Dilma em 2012, na 15ª Conferência Internacional Anticorrupção realizada em Brasília) disseminou-se no setor público e privado de nosso país, tornando-se uma das mais importantes protagonistas das gravíssimas desigualdades sociais que vivenciamos. Somos a 6ª maior potência econômica do mundo, mas, quando medimos o nível de distribuição de renda e qualidade de vida de nossa população, ostentamos a vergonhosa posição de estar na 85ª colocação.
Se antes a inflação assumia papel de corroer nossa moeda e impedir que o dinheiro público chegasse a escolas, hospitais, segurança pública, moradias, estradas; hoje este papel vem sendo desempenhado de forma muito mais forte e eficaz pela CORRUPÇÃO, impedindo que tenhamos serviços públicos de qualidade, como por exemplo a educação, e, o mais grave, destruindo sonhos de nossas crianças, adolescentes e jovens, fazendo-os crer muitas vezes, que a desonestidade seja o único caminho para se alcançar o sucesso e a tão sonhada independência financeira no Brasil.
É nesse ambiente e sob essa imensa responsabilidade social que Vossa Excelência, Dr. Ricardo Machado, é reconduzido ao cargo de Procurador Geral de Justiça. Eleito desta feita, com o reconhecimento da maioria de seus pares, dando-lhe assim, legitimidade para aprimorar nossa instituição, cortando-a na própria carne quando se fizer necessário, depurando-a, mantendo acima de tudo, a essência do Ministério Público e de qualquer outra instituição pública, que é o de bem servir ao povo.
Muitas dificuldades se perfilham ao nosso redor. Carência de membros e servidores, total insegurança para desempenho de nossas funções, estrutura física deficitária e um orçamento impeditivo de cumprir metas básicas de gestão. Não bastassem os parcos recursos que historicamente nos são repassados pelo tesouro estadual, ainda temos que suportar o contingenciamento de nossas receitas pela Lei Orçamentária Anual, que, a cada ano, contempla dispositivo que impede o Ministério Público de gerir seu próprio orçamento, ferindo assim norma constitucional que resguarda a autonomia administrativa e financeira da instituição.
As dificuldades são muitas e os desafios também. Foi confiado a Vossa Excelência a difícil tarefa de dirigir o Ministério Público do Ceará nesse mar revolto. Seu espírito democrático, paciente e conciliador serão fundamentais para atravessarmos essa tormenta. Entretanto, sem a união de todos, membros e servidores, não chegaremos a lugar algum. Sigamos portanto juntos e coesos.
Estejamos certos de que, inobstante as imensas dificuldades, o povo brasileiro confia no Ministério Público. Não podemos decepcioná-los, traindo a essência de nossa instituição, que teve como gênese a aspiração popular republicana. Atendamos pois os anseios de nossa sociedade, concentrando todos nossos esforços e energia no combate à CORRUPÇÃO.
Desmistifiquemos as palavras falaciosas e mal intencionadas de que o brasileiro tem a cultura do “jeitinho” e é tolerante com a corrupção. Nosso povo tem aversão à ilegalidade e à corrupção. Somos uma sociedade justa e trabalhadora, comprometida com as mudanças por um país mais digno e sério.
Que os movimentos populares de 2013 continuem vivos em nossas memórias e que atendamos os gritos das ruas. É chegado o momento em que a sociedade brasileira começa aos poucos a se libertar da escravidão mental que lhe oprimiu durante tantos anos. Tenhamos a sensibilidade de entender o importante recado que nos foi passado de forma tão contundente, principalmente nós que integramos o Ministério Público.
Deus o abençoe Dr. Ricardo Machado e lhe dê luzes para dirigir nossa instituição sempre ao encontro dos anseios do povo cearense, povo confiante, merecedor e digno de um Estado mais justo e solidário.
Plácido Barroso Rios
Presidente da Associação Cearense do Ministério Público