O jornal O Povo publicou nesta sexta-feira (03) artigo de opinião do associado Marcus Amorim, que também é diretor do Departamento de Estudos Aplicados da ACMP.

Com o título “Revogaço da Democracia”, o promotor de Justiça discorre sobre o Decreto n.º 9759/19, da Presidência da República, assinado por ocasião dos cem dias de governo, que extingue na alçada federal os colegiados, exceto nas instituições federais de ensino e aqueles criados pelo atual governo.

Confira:

 

Revogaço da democracia

 

O Decreto n.º 9759/19, da Presidência da República, assinado por ocasião dos cem dias de governo, extingue na alçada federal os colegiados, exceto nas instituições federais de ensino e aqueles criados, pois bem, no atual governo. Estima-se que algo em torno de 600 colegiados serão atingidos a partir de 28 de junho, data na qual o decreto passará a surtir efeito. Mesmo aqueles criados por lei poderão ser afetados porque sofrerão algum esvaziamento.

Na imprensa, encontram-se declarações do ministro da Casa Civil sobre o assunto, em que ele tenta justificar o “revogaço” como uma estratégia para desburocratizar a administração federal e de economia dos recursos públicos. Entretanto, o argumento se mostra falacioso. Há muitas outras maneiras menos drásticas de destravar a máquina pública, e curiosamente, existe até uma secretaria especial, vinculada ao Ministério da Fazenda, justamente para esse fim. A extinção sumária e generalizada dos colegiados soa, porém, como matar a vaca para eliminar o carrapato. Por sua vez, não foram divulgados, e duvido que sequer tenham feito esse levantamento, dados sobre as despesas com os colegiados. Seja como for, arrisco dizer que é um típico caso de economia de palito em festa de caviar.

Sob qualquer ângulo pelo qual se veja essa iniciativa, que pode contaminar as outras esferas de governo, trata-se de um retrocesso inaceitável e um duro golpe na democracia brasileira. Os colegiados, compostos por representantes do Poder Público e da sociedade civil organizada, são uma ferramenta imprescindível de democracia participativa, aquela em que o cidadão interage diretamente com as instâncias governamentais na elaboração e execução de políticas públicas, inclusive em áreas sensíveis como meio ambiente e direitos humanos, e até mesmo gestão da internet, além de normatização e fiscalização da atividade pública. Nos próximos meses, o governo federal poderá editar novos decretos, recriando e remodelando colegiados à maneira que melhor lhe aprouver, e ao que parece, com menos transparência e controle social.

https://www.opovo.com.br//jornal/opiniao/2019/05/02/revogaco-da-democracia.html