Viegas pede demissão e Lula nomeia Alencar para Defesa Com fortes críticas ao Exército, o ministro José Viegas (Defesa) deixou ontem o governo. O pedido de demissão, feito no dia 22 de outubro, foi aceito ontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que nomeou para seu lugar o vice-presidente José Alencar (PL), 73. Ele assume a pasta na próxima segunda-feira. É a primeira demissão de um ministro de Lula em razão de uma crise entre os integrantes do próprio governo. Viegas, 62, diplomata de carreira, deixa o cargo depois de manter uma série de atritos com as Forças Armadas desde quando assumiu o posto, em janeiro de 2003, no início do mandato de Lula.

Na carta encaminhada ao presidente e divulgada ontem, Viegas diz que entre os militares há “persistência de um pensamento autoritário, ligado aos remanescentes da velha e anacrônica doutrina da segurança nacional” e que “já é hora de que os representantes desse pensamento ultrapassado saiam de cena”.

As declarações do ministro foram uma referência à divulgação da nota pelo Centro de Comunicação Social do Exército, no último dia 17, quando foi publicada reportagem pelo “Correio Braziliense”, na qual fotos de um homem nu eram atribuídas ao jornalista Vladimir Herzog antes de ser morto no DOI-Codi de São Paulo em 1975.

Naquela nota, o Exército disse que “as medidas tomadas pelas forças legais foram uma legítima resposta à violência dos que recusaram o diálogo”.

O episódio foi o estopim para a saída de Viegas. A nota do Exército desgastou ainda mais as relações do ministro Viegas com as Forças Armadas, que já vinham tensas desde o debate sobre o reajuste salarial dos militares no começo do ano, que acabou se tornando público e indo parar nas páginas dos jornais.

“É incrível que a nota original se refira, no século 21, a “movimento subversivo” e a “movimento comunista internacional”. É inaceitável que a nota use incorretamente o nome do Ministério da Defesa em uma tentativa de negar ou justificar mortes como a de Vladimir Herzog.

É inaceitável também, a meu ver, que se apresente o Exército como uma instituição que não precise efetuar “qualquer mudança de posicionamento e de convicções em relação ao que aconteceu naquele período histórico'”, declarou Viegas a Lula em sua carta de demissão de nove parágrafos.

Demissão frustrada Antes de decidir sair do governo, Viegas queria que Lula demitisse o comandante do Exército, Francisco Roberto Albuquerque. Atribuía a ele a elaboração da nota do caso Herzog, cujo teor foi considerado “inadequado” pelo governo. Na ocasião, o Exército chegou a informar que a formulação do texto foi de exclusiva responsabilidade do Cecomsex e que Albuquerque não teve conhecimento do conteúdo.

Lula não demitiu Albuquerque e deu o caso por encerrado assim que o Exército publicou a segunda nota, recuando do teor da primeira. “Não posso ignorar que aquela nota foi publicada sem consulta à autoridade política do governo.

Assumo a minha responsabilidade. Agi neste episódio desde o primeiro momento. Informei Vossa Excelência, sugeri ações, convoquei, no próprio domingo (17) o comandante do Exército, entreguei-lhe um ofício que pedia apuração das responsabilidades e a correção da nota publicada. Segui a orientação de Vossa Excelência e não divulguei posição e pontos de vista individuais”, conclui Viegas em sua carta de demissão.

No texto divulgado ontem, Viegas sugere indiretamente que Albuquerque tinha conhecimento da nota do Exército. Diz ele que “usando linguagem inadequada, [a nota] dava a impressão de que o Exército ou, mas apropriadamente, os que redigiram a nota e autorizaram a sua publicação, vivem ainda o clima dos anos setenta”.