70% do dinheiro lavado no País vem do desvio de verba pública Quando a lei de lavagem entrou em vigor, há seis anos, grande preocupação do governo era com o narcotráfico 70% do dinheiro que organizações criminosas lavam no Brasil decorre da corrupção e de crimes contra a administração pública, revelou ontem o diretor de Recomposição do Patrimônio da União – braço da Advocacia-Geral da União (AGU) que rastreia ativos ilícitos em território nacional e no exterior -, advogado Milton Nunes Toledo Júnior.

“Quando a lei de lavagem entrou em vigor, há seis anos, a grande preocupação do governo era com o narcotráfico”, ressaltou Toledo Júnior. “O poder público suspeitava que o dinheiro lavado era preponderantemente produto do tráfico de entorpecentes. Hoje, está demonstrado que 70% de todo o dinheiro que se lava no País é oriundo da corrupção envolvendo desvio de verbas públicas.”

Toledo Júnior, que também dirige o Departamento Judicial Internacional da AGU, falou sobre recursos que a corrupção arranca dos cofres públicos no seminário Combate à Fraude, à Lavagem e Recuperação de Ativos Ilícitos. O evento foi promovido em parceria pela Secretaria de Estado da Justiça e Defesa da Cidadania, Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas e o escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados. O encontro reúne em São Paulo especialistas americanos, suíços, ingleses e brasileiros.

Fontes do Banco Central e do Ministério Público estimam que, a cada ano, pessoas físicas e jurídicas estabelecidas no Brasil enviam cerca de US$ 17 bilhões a paraísos fiscais como parte de operação para lavagem.

VILIPÊNDIO

Toledo Júnior relatou as dificuldades de localização e recuperação de bens do Tesouro, atribuindo-as a “um pesado processo burocrático” e demoradas negociações com autoridades estrangeiras. Ele ressaltou que, apesar desses entraves, a AGU e outros órgãos públicos têm realizado missões bem-sucedidas. “O patrimônio público está sendo vilipendiado todos os dias. Daí a importância e a necessidade de uma atuação conjunta”, alertou o diretor.

Ele admitiu que os resultados ainda não são animadores. Citou o montante desviado das obras do Fórum Trabalhista de São Paulo, calculado em US$ 100 milhões. Até agora, a AGU localizou US$ 5,13 milhões, dos quais apenas US$ 830 mil foram repatriados. “Fazendo uma autocrítica, verificamos que ainda não conseguimos recuperar 10%.” Ele assinalou: “A AGU não pode, por uma ordem judicial brasileira, bloquear ativos na Nicarágua, precisa da intervenção do Judiciário de lá.”

O advogado informou que, até dezembro, a AGU vai firmar contrato com escritório em Londres para representar o Brasil na batalha para repatriar dinheiro que o ex-prefeito Paulo Maluf teria depositado na Ilha de Jersey.

Segundo o diretor, as operações de lavagem são complexas, estruturadas. “A maior parte do dinheiro é lavada por meio de mecanismos desconhecidos do poder público. Quando descobrimos um tipo de ocultação, a criminalidade migra, cria uma engenhosidade fantástica. É uma criatividade invejável, para o mal, dão roupagem de legalidade a um patrimônio que foi obtido pela via da ilegalidade e o poder público sempre correndo atrás.”

Ele destacou que a AGU e o Ministério da Justiça vão dar um fim nessa rotina. “Quando se lava o dinheiro, ele volta ao mercado formal, aparentemente lícito. A partir da constatação de desvio de dinheiro público vamos focar esforços na recomposição do patrimônio. Há a possibilidade de, a médio prazo, as organizações irem se desmantelando.”