Juiz que matou vigia tem antecedente por abuso no Ceará Quando viu na televisão as imagens do juiz Pedro Pecy Barbosa Araújo, de 57 anos, apontando uma arma para a cabeça do vigia José Renato Coelho, morto dentro de um supermercado em Sobral, o comerciante José Sarney Aguiar de Souza, de 33 anos, fez uma viagem no tempo. Ele também já esteve na mira do revólver de Pedro Pecy. Foi há sete anos, logo depois que ele assumiu o cargo de juiz titular da 2a. vara naquela cidade.

Numa churrascaria, Sarney conversava com outras seis pessoas. Numa mesa ao lado, acompanhado de uma mulher e pelo menos uma das filhas, o juiz bebia cerveja. A ponta do cigarro que uma das acompanhantes de Sarney fumava caiu próxima aos pés de Pedro Pecy. O comerciante pediu-lhe desculpas. Mas o juiz levantou-se, apontou a arma para a sua cabeça e disse o que, há duas semanas, repetiu para o vigilante antes de matá-lo: “Você está preso”.

Pedro Pecy pegou as chaves do carro de Sarney e ordenou que ele aguardasse a chegada da polícia. Uma hora depois, por volta das 16h, ele voltou acompanhado de uma kombi da PM. Apontou para o comerciante, que foi levado preso.

Segundo Sarney, antes de irem à delegacia, rodaram cerca de uma hora. Ficou preso numa cela comum e teve que pagar R$ 10 para que um funcionário limpasse o local. O comerciante não foi autuado, mas só foi liberado às 20h, depois que um primo dele, deputado, ligou para Pecy e intercedeu.

Segundo Sarney, o juiz ignorou até mesmo os apelos do seu advogado, que argumentou não haver motivo para prisão. Pecy também impôs uma condição para libertá-lo: no dia seguinte, de manhã, teria que comparecer ao fórum.

Receoso, Sarney nunca denunciara o juiz: “Mas ele se lembra bem desse caso com certeza. Esse tempo todo considerei aquilo abuso de poder. Ele pensa que, por ser juiz, pode fazer o que quiser e humilhar as pessoas”.

Para os funcionários do fórum, onde compareceu pela última vez três dias antes de cometer o crime, Pedro Pecy parecia ser cordato, pacífico e observador. Silvana Amaro Andrade, atendente, trabalhou com ele nos últimos dois anos e disse que todos ficaram chocados.

A mesma reação tiveram outros colegas com quem trabalhou quando ainda exercia a profissão de jornalista. Para Hélio Rocha Lima, que o conhece há mais de dez anos, a notícia do crime surpreendeu: “Nunca vi o Pecy violento”. Outro jornalista, Ossian Lima, chegou a definir o juiz como irreverente e brincalhão.

Não fosse o crime, o currículo de Pedro Pecy é considerado bom. Casado e pai de três filhas, ele é formado em jornalismo (1976) e em direito (1987) pela Universidade Federal do Ceará. Trabalhou no jornal “Tribuna de Ceará” e na Rádio Verdes Mares. Por concurso público, assumiu o cargo de promotor e, depois, de juiz das comarcas de Madalena (1994), Jaguaribe (1996) e de Sobral desde 1998.

Pedro Pecy vai a julgamento e também foi indiciado num processo administrativo que investiga se cometeu indisciplina no exercício do cargo.