Para especialistas, voz de prisão dada ao ex-prefeito de SP foi ilegal Cinco advogados ouvidos ontem pela Folha disseram que a voz de prisão dada pelo senador Antero Paes de Barros (PSDB-MT) ao ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta sob a acusação de desacato à autoridade não tem amparo legal. Dois deles chegaram a dizer que o próprio senador poderia ter recebido voz de prisão por abuso de autoridade. Três ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) também criticaram o senador, mas pediram que seus nomes não fossem revelados.

Na avaliação dos advogados, o fato de o ex-prefeito ter sido provocado descaracteriza a resposta como desacato. A frase de Pitta que motivou a prisão –“e se eu indagasse se V. Excia. [Antero] continua batendo na sua mulher?”– foi dita após o senador lhe perguntar se continuaria em silêncio caso ele indagasse se o ex-prefeito é corrupto.

“Eu já vi muito advogado dar voz de prisão para a autoridade em casos parecidos”, disse Fernando Castelo Branco, professor na área criminal da PUC-SP. Ele lembra que qualquer pessoa que presencie um crime pode prender o autor em flagrante, mesmo sem ser autoridade policial.

O criminalista José Luís Oliveira Lima ressalta que o próprio Celso Pitta, em teoria, poderia ter dado voz de prisão a Antero.

Lima e Castelo Branco consideram que, mesmo que houvesse desacato, o senador não deveria mandar prender Pitta, porque o crime seria “de menor potencial ofensivo”. O correto seria apenas registrar o fato na polícia.

Antônio Sérgio Pitombo e Luiz Flávio Gomes, também da área criminal, concordam. Antes mesmo de saber da soltura do ex-prefeito, Gomes, que é juiz aposentado, disse que isso ocorreria.

Para Murilo da Silva Freire, Antero “fez uma pergunta agressiva e recebeu uma resposta igualmente agressiva”.

Os três ministros do STF ouvidos disseram, em caráter reservado, que a prisão de Pitta era insustentável, por causa do princípio constitucional da presunção de inocência, pelo qual ninguém pode ser considerado culpado antes de condenação definitiva. Eles também consideraram que Antero foi provocador.

Para os ministros, porém, as CPIs têm o poder de prender investigados. Segundo um deles, o presidente da comissão tem autoridade equivalente à de um juiz. Pela Constituição, as CPIs têm “poderes de investigação próprios das autoridades judiciais”.

O interrogatório e a conseqüente voz de prisão de Pitta são fruto de poderes investigatórios que as CPIs adquiriram na Constituição de 1988. Essas comissões podem utilizar qualquer instrumento de investigação de uma autoridade judicial, como convocação de testemunhas, solicitação de perícias e busca e apreensão de provas.

O depoente comparece à comissão como testemunha ou como investigado. Como testemunha, tem a obrigação de dizer a verdade. Caso se recuse a responder às perguntas ou se for pego mentindo, pode ser preso. Já como investigado, o depoente pode permanecer calado devido à garantia constitucional de que ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo.

Pitta tinha uma liminar do ministro do Supremo Cezar Peluso dando-lhe o direito de depor como investigado.

Fita do caso Waldomiro

Antero foi uma das pessoas a ter acesso à fita em que o ex-assessor da Presidência Waldomiro Diniz aparece pedindo propina ao empresário de jogos Carlos Ramos, o Cachoeira, em 2002. Waldomiro foi demitido quando a fita veio a público, em fevereiro.

O senador foi quem entregou o vídeo ao subprocurador-geral da República José Roberto Santoro.