Lei eleitoral vai mudar

A aposentadoria compulsória do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Carlos Velloso, a partir de 19 de janeiro, decretará a morte da regra que obriga os partidos políticos a formarem, nos estados, alianças iguais às fechadas em âmbito nacional – norma conhecida como verticalização.

A obrigação de os partidos formarem alianças nacionais foi imposta pelo TSE na campanha de 2002. Articulada pelo ministro Nelson Jobim, então na presidência daquela corte, ela foi considerada pelos especialistas em direito eleitoral como favorável ao PSDB do presidente Fernando Henrique Cardoso, pois amarrava a ele, em todo o país, o gigante e capilarizado PMDB, com quem o candidato José Serra havia se articulado.

Nos bastidores do TSE, grassa a versão de que a nova composição da corte, a partir da saída de Velloso, favorecerá a posição do ministro Marco Aurélio de Mello, relator da consulta feita pelo PSL a respeito do tema – o partido enviou uma carta ao tribunal, questionando a validade da regra nas eleições de 2006. Mello é declaradamente contra a verticalização. Mas sua opinião não vinha prevalecendo porque o presidente Carlos Velloso era declaradamente a favor.

Com a aposentadoria compulsória deste, que completa 70 anos dentro de alguns dias, Marco Aurélio assumirá a presidência do TSE. E a vaga aberta por Velloso será preenchida pelo ministro Gilmar Mendes, ex-advogado-geral da União durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso. Ou seja, sairá um devoto defensor da verticalização, entrará um potencial opositor dela.

O próprio Marco Aurélio de Mello já deu sinais de que conta com a nova composição do TSE para tirar acabar com o instituto da verticalização. Em duas oportunidades nos últimos 15 dias, ele retirou da pauta do tribunal o julgamento da consulta do PSL.

Na última delas, ocorrida na quinta-feira, dia 15, ele perguntou ao então presidente Carlos Velloso qual a posição dele sobre o tema e ouviu uma resposta abertamente favorável à continuidade da regra. Então, Mello se declarou inabilitado para apresentar seu voto naquele instante. O TSE entrou em recesso e só volta no dia 1 de fevereiro de 2006, já com a nova configuração.

Na atual circunstância, o fim da verticalização prejudica o PT e uma eventual candidatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição. Porque deixará os partidos livres para firmarem alianças nos estados. Assim, crescem as chances de o PMDB, noiva cobiçada por todos os candidatos a presidente da República, lançar um candidato próprio, por exemplo, contrariando o desejo de Lula de tê-lo a seu lado desde o início da campanha. Ou de siglas como PP e PTB aderirem a outras candidaturas nos estados, a despeito de estarem perfiladas ao PT em nível nacional.

Oficialmente, entretanto, o PT se diz contra a verticalização. E chegou inclusive a negociar no Congresso a aprovação de uma alteração no Código Eleitoral para exterminá-la. Foi um dos poucos temas a que o partido se manteve fiel desde a eleição de 2002. Mesmo assim, um dos motivos pelos quais o projeto não prosperou no Parlamento foi um pedido de vista do deputado Odair Cunha (PT-MG), ligado ao deputado cassado José Dirceu (PT-SP).

ENTENDA O CASO

Um casamento em todo o país

A chamada verticalização nasceu em fevereiro de 2002, por obra de uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em resposta à ofício enviado pelo deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) seis meses antes. Não se tratava de uma regra nova, mas de uma interpretação do tribunal sobre o Código Eleitoral em vigor.

Por ela, as alianças firmadas pelos partidos políticos em nível nacional seriam obrigatoriamente reproduzidas nos estados. Em março daquele ano, o TSE editou nova resolução, estabelecendo que os partidos que não lançassem candidatos à Presidência da República ficariam livres para formar alianças como quisessem nos estados.

As novidades receberam oposição imediata do PT, do PL, do PCdoB, do PSB, do PPS e do PFL. Todos entraram com Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra as medidas, mas o Supremo Tribunal Federal julgou que o TSE não legislara, apenas interpretara a norma vigente. Portanto, elas eram válidas.

Em abril de 2002, em mais uma investida dos políticos contra a verticalização, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) acabando contra a obrigatoriedade de repetição nas coligações. Mas não vingou, pois era intempestiva e também não recebeu boa acolhida na Câmara dos Deputados.

Antes da resolução do TSE, os partidos pactuavam alianças sem qualquer regra. Uma mesma sigla podia se aliar do PT no Acre e ao PFL no Rio Grande do Sul, isso tudo apoiando um candidato à presidente do PMDB, por exemplo. Os defensores da medida argumentam que ela dá mais consistência aos partidos, pois os obrigam a um mínimo de coerência. Os opositores afirmam que, no Brasil, a cultura política começa nos estados e daí se nacionaliza, não o contrário, como prevê a verticalização. (UB)